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Usuários questionam mudança de cor e compartilhamento de ciclovias com pedestres

Enquanto uns questionam o custo da pintura, que poderia ser melhor empregado em outras prioridades, outros apontam que o uso compartilhado por pedestres e ciclistas, onde existe calçada para os pedestres, é perigoso e não deveria ser estimulado

Fabiana Blazeck Sorrilha (Portal Porque)

Tinta foi aplicada sobre rachaduras nas proximidades da ponte de Pinheiros. Ciclistas apontam necessidade de reformas e construções para conectar trechos que hoje estão sem ligação. Foto: José Carlos Fineis

Os adeptos da bicicleta de Sorocaba não querem apenas uma nova cor na ciclovia. Querem manutenção, conectividade, sinalização, segurança e acessibilidade. Também querem que a ciclovia seja respeitada, especialmente por pedestres que usam o espaço para caminhadas, mesmo quando há calçada disponível para eles.

Essas são, em resumo, as manifestações dos munícipes em redes sociais da Prefeitura de Sorocaba, sempre que o assunto é a nova cor da ciclovia.

Em meados de abril, o prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) anunciou que estava mudando a cor da ciclovia de vermelho para azul, a cor que escolheu para fazer sua campanha política — e também a cor da logomarca de seu partido –, e que revitalizaria os 120 km de ciclovias existentes, com os trabalhos finalizados até o final deste ano.

Manga tentou justificar a troca do vermelho pelo azul para indicar que as ciclovias podem ser compartilhadas por ciclistas e pedestres — o que é criticado por especialistas de trânsito, já que nos lugares onde existe calçada para pedestres, o compartilhamento das ciclovias só trará mais perigo, sem necessidade.

Por outro lado, há quem questione o montante que será gasto na mudança, na ordem dos R$ 3 milhões. Para muita gente, esse é um valor que poderia ser aplicado em outras áreas, como na Saúde Pública, por exemplo, que carece de mais médicos pediatras, conforme noticiado pelo Portal Porque (leia aqui).

Reforma ou maquiagem

Ciclistas afirmam que, em alguns pontos da ciclovia, a pintura em azul está sendo feita sobre rachaduras no pavimento, ou seja, sem corrigir a pista e como uma forma de “maquiar” a situação ruim da ciclovia. Um deles tirou fotos de rachaduras não consertadas no trecho próximo à ponte de Pinheiros, e enviou para a redação do Porque.

Claudinei de Jesus Oliveira, 51 anos, funcionário público da Secretaria de Educação e que criou o grupo “Os 6 dos Pedal”, no qual reúne sua mulher e seus quatro filhos para passeios em família duas a três vezes por semana, disse que ficou estarrecido com o que chamou de “ponto fora da curva”.

A primeira coisa que o servidor questiona é o valor de R$ 3 milhões a ser investido na ciclovia. Ele contesta, dizendo que o montante anunciado para a reforma e pintura soa como se fosse uma conquista. Na verdade, esse valor está previsto no Plano Diretor de Transporte Urbano e Mobilidade de Sorocaba (PDTUM), páginas 79 e 112, para ampliar e fazer as interligações nos trechos da ciclovia que hoje não estão conectados.

“Se fosse uma medida séria, não haveria o que criticar, mas, da forma midiática que foi anunciada, assim como tantas outras promessas mirabolantes anunciadas por essa administração, isso não passa de publicidade para o atual prefeito”, comentou.

Trechos em péssimo estado

Usuário das ciclovias na zona norte, Claudinei cita alguns pontos em que a situação do pavimento está péssima e que nunca recebeu manutenção. Entre os trechos de ciclovia que podem, inclusive, causar queda dos ciclistas, estão o do bairro Vitória Régia, o trecho em frente ao terminal BRT Vitória Régia, na Avenida Antônio Silva Saladino, e na ligação da Avenida Antônio Silva Saladino com a Avenida Ulisses Guimarães.

Claudinei diz que, em 2021, cobrou a Prefeitura para que as melhorias fossem feitas nesses locais. A lista não para aí. Na avenida Itavuvu e na avenida Ipanema, há vários trechos sem sinalização que obrigam o ciclista a transitar pela calçada ou no corredor BRT.

Outra munícipe, Iara Raquel, num dos comentários sobre a ciclovia azul, opiniou: “Minha opinião é que poderiam pegar o dinheiro que gastaram na tinta e de fato investir nas ciclovias! Moro no Cajuru e por aqui as ‘ciclovias’ são piada! Não temos rampa de acesso, é apenas uma calçada pintada, falta iluminação, muito mato, um perigo só! A avenida Paraná precisa urgentemente ser vista de verdade! Fora o saneamento… Nesses últimos meses, ficamos sem água todas as semanas, ao menos dois dias. Um descaso com a população!”

Lugar de pedestre é na calçada

Lugar de pedestre é na calçada. E a ciclovia é feita para as bicicletas. Assim está escrito no Código de Trânsito Brasileiro (CTB), mas, ao incentivar que o pedestre compartilhe a ciclovia com a bicicleta, Manga deixa de lado a premissa de boa convivência na mobilidade urbana. Ainda segundo a lei de trânsito brasileira, o pedestre só pode compartilhar o espaço destinado aos ciclistas quando não há calçada.

O motivo é muito óbvio: uma bicicleta, mesmo em baixa velocidade, se comparada a um automóvel, por exemplo, pode causar um sinistro de trânsito que pode ter tanto o ciclista quanto o pedestre como vítimas. Para que cada ente da mobilidade urbana saiba usar seu espaço com segurança, é necessário investir em educação e orientação. Mas não é o que acontece e o Parque das Águas é um exemplo negativo onde pedestres invadem a ciclovia para suas caminhadas.

“É sério isso? Ciclovia é ciclovia, por isso existe a calçada. Abriu brecha para os acidentes. Se antes o pedestre já não prestava atenção quando caminhava na ciclovia, imagina agora que vão se achar no direito…”, indignou-se Wil Brito em seu comentário na rede social.

Para Renato Campestrini, especialista em trânsito, o compartilhamento do espaço entre ciclistas e pedestres equivale a incentivar o compartilhamento entre carros e pedestres nas ruas, já que, em vez de as pessoas estarem num lugar seguro, como a calçada, estarão num espaço segregado especificamente para as bicicletas. “Até que ponto esse compartilhamento é salutar?”, questiona. Ele acrescenta ainda que, onde há calçada, não faz sentido incentivar o compartilhamento em toda a ciclovia.

“Por mais nobre que seja o objetivo do compartilhamento, você tira o objetivo de dar agilidade ao deslocamento com uma bicicleta do Integrabike, por exemplo, que tem o papel justamente de complementar as viagens de pessoas que usam o transporte coletivo”, opina Campestrini.

Já Claudinei opina que o pedestre quer se sentir seguro, daí a importância de o governo municipal dar atenção também às calçadas. “Sorocaba infelizmente não cumpre nem com a manutenção das calçadas na região central da cidade”, acrescenta. Para ele, a ideia é cobrar um melhor gasto do dinheiro público. Ele lembra ainda que o Maio Amarelo está aí, para priorizar a segurança de todos, especialmente aqueles que são mais frágeis na mobilidade; o pedestre e o ciclista. E encerra deixando um recado para o governo: “A pintura deixa para depois, mesmo tendo uma estrutura de calçadas adaptadas ou ciclovias, mesmo sem pintura, ela já vai cumprir seu papel”, finaliza.

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