
Prefeitura de Sorocaba não poderá mais tomar pertences das pessoas em situação de rua, como fez, com ampla divulgação, em maio deste ano. Foto: Secom/PMS
Em decisão cautelar publicada terça-feira (25), o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes proibiu a remoção forçada de pessoas em situação de rua ou o recolhimento de seus pertences, e deu um prazo de quatro meses para que o governo federal apresente um plano de ação para essa demanda social.
Em Sorocaba, a prática de retirar pessoas das ruas mediante coação e tomar seus pertences, chamada pelo governo de Rodrigo Manga (Republicanos) de “Programa Humanização”, já foi denunciada em várias ocasiões pelo Portal Porque (veja links abaixo).
Em maio deste ano, a Prefeitura de Sorocaba divulgou a realização de uma megaoperação para recolher “inservíveis” como colchões e cobertas pertencentes a moradores de rua, às vésperas da chegada de uma frente fria na cidade (leia aqui).
Antes, em dezembro, o Porque já havia denunciado a apreensão rotineira de cobertores e outros pertences das pessoas em situação de rua, pelas equipes do Governo Manga (leia aqui). Também comerciantes que fornecem refeições e apoio para o povo de rua estariam sendo ameaçados pela fiscalização municipal.
Agora, esse tipo de ação é contra a lei, conforme decisão do ministro do STF, que proibiu governos estaduais, distritais e municipais de realizarem a remoção e transporte compulsórios de pessoas em situação de rua, bem como o recolhimento forçado de bens e pertences.
Segundo a decisão do STF, para realizar ações de “zeladoria urbana”, os governos deverão anunciá-las previamente, com detalhes sobre dia, horário e local. Assim, as pessoas em situação de rua poderão recolher seus pertences e ocorrerá “a limpeza do espaço sem conflitos”.
Fim da hostilidade
Moraes ainda proibiu a utilização de “técnicas de arquitetura hostil”, como aquelas que são denunciadas com frequência pelo padre Júlio Lancelotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua de São Paulo. O ministro atendeu a um pedido protocolado pelos partidos Rede e Psol, e pelo MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto).
O governo do prefeito Rodrigo Manga já praticou atos hostis para coibir a permanência de pessoas em situação de rua pela cidade, como divulgou o Porque. Uma ação rotineira é a colocação de cones em vagas de carga e descarga no centro da cidade para, dessa forma, impedir que voluntários estacionem veículos e distribuam alimentos à população carente que dorme ao relento (leia mais aqui).
Desumanização
Em abril deste ano, o ex-sem teto Márcio Quirino, que morou 14 anos nas ruas, foi ouvido pela reportagem do Porque e chamou de “faxina social” as ações que a Prefeitura chama de “Humanização”. Segundo ele, que já presidiu a Associação de Moradores de Rua de Sorocaba, o prefeito Rodrigo Manga “é daqueles que faz política de higienização social contra pessoas nesse tipo de vulnerabilidade”.
Um advogado que acompanhava Quirino contou que em Sorocaba, atualmente, o período de acolhimento dessa população é curto, de sete dias. “Há relatos de abordagem violenta, pessoas mandadas embora da cidade, internadas compulsoriamente, envolvimento sem transparência de comunidades terapêuticas que visam lucro, instituições dopando internos sem receita médica.”. Leia a íntegra da entrevista com Quirino aqui.
Sorocaba precisar saber quantos são
O ministro Alexandre de Moraes também estabeleceu um prazo de 120 dias para que o governo federal apresente um plano de implementação da política nacional para pessoas em situação de rua. Além disso, a União e os governos estaduais e municipais terão de apresentar um “diagnóstico pormenorizado da situação”, com o número de pessoas em situação de rua e de vagas em abrigos.
Com isso, governos municipais e distritais terão o prazo de 120 dias para acrescentar aos dados sobre a população em situação de rua, como quanto pessoas são, onde se concentram e quais as condições dos locais para alimentação e acolhimento.
Sorocaba não consegue contabilizar as pessoas em situação de rua e o último número oficial divulgado pela Prefeitura é de 2019, quando o município contava haver 825 moradores de rua, dos quais uma grande maioria, ou 84,37% deles, eram homens. Porém, o número apresentado pela municipalidade não representa a quantidade real de pessoas na rua, já que é grande a mobilidade entre elas, que entram e saem da cidade com frequência.
A população de rua no Brasil em 2022 superou as 281 mil pessoas. Isso representa um aumento de 38% desde 2019, após a pandemia de covid-19. Essa é a conclusão de um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
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