
A foto divulgada pela Prefeitura dá a entender que uma multidão foi ao evento organizado pelo prefeito, mas o que atraiu o público foi a distribuição das cestas básicas. Foto: Divulgação/Prefeitura de Sorocaba
O prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) tem violado a lei constantemente ao retirar cestas básicas dos Cras (Centro de Referência em Assistência Social) para serem distribuídas em eventos da Prefeitura com sua presença. O objetivo é atrair mais público para ouvir os discursos do prefeito e para compor as fotos e vídeos publicados nas redes da Prefeitura e do próprio Manga.
Uma destas ações foi documentada em uma série de fotos e vídeos enviados por um leitor à redação do Portal Porque. As imagens mostram o secretário de Cidadania de Sorocaba, Clayton Lustosa, distribuindo cestas básicas depois da solenidade de inauguração das obras de melhoramento da Avenida General Motors na última terça-feira (19).
Dois advogados analisaram as imagens e notaram evidente caracterização de improbidade administrativa (leia mais abaixo).
Segundo apurou a reportagem do Porque, 300 cestas básicas foram retiradas do Cras do bairro Vitória Régia para serem distribuídas após a cerimônia de inauguração, realizada no Parque Amedeo Franciulli.
Uma fonte ouvida pela reportagem conta que recebeu um telefonema do Cras para retirar a cesta básica solicitada, mas o endereço de entrega não era a unidade e sim a Avenida General Motors, onde ocorria o evento com o prefeito. Ela diz que ninguém escondia o incômodo por ter de esperar os discursos e o fim do evento para levar as cestas.
Mais tarde, o prefeito divulgou o evento nas suas redes sociais, gabando-se do volumoso público, mas não informou que houve distribuição de cestas básicas, o que também é omitido pela reportagem da Secretaria de Comunicação da Prefeitura (Secom) publicada no portal do município.
O portal da Prefeitura informa que no mesmo evento houve inscrições de desempregados no Programa de Atendimento ao Trabalhador (PAT), aferição de pressão, medida de glicemia, distribuição de mudas de plantas e até uma apresentação de Buddy, o cão terapeuta da Guarda Civil Municipal (GCM), atividades que o prefeito tem levado a todos os seus eventos para atrair público.
Improbidade
Consultada pelo Portal Porque, a advogada Helena Ferraz considerou que essa prática viola princípios da administração pública e pode configurar improbidade administrativa. “Tanto a falta de publicidade e omissão da ação, bem como a promoção equivocada do agente público e personalização de atos públicos, como entrega de obras, atos e serviços configuram improbidade”, disse a advogada.
“Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: praticar, no âmbito da administração pública e com recursos do erário, ato de publicidade que contrarie o disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal, de forma a promover inequívoco enaltecimento do agente público e personalização de atos, de programas, de obras, de serviços ou de campanhas dos órgãos públicos”.
Helena lembra que a Política Nacional de Assistência Social determina que é dever do Estado não apenas prover alimentos às pessoas em vulnerabilidade social, mas também oferecer todo um acolhimento, incluindo bens e serviços correspondentes às carências de cada um.
No entanto, segundo ela, ao selecionar pessoas cadastradas em uma lista, sem a comprovada necessidade emergencial e fazer o chamamento um a um a um em local que não seja um centro de referência, Manga feriu o princípio da impessoalidade.
“E, ainda, privando essas pessoas de fazerem parte de toda essa estrutura do Cras, que avalia moradia, encaminha para médicos, oportunidades de trabalho, formação e outros. Isso acaba se transformando em uma ação assistencialista, pois impossibilita que essas pessoas façam parte de uma política pública permanente”, explica Helena.
Para ela, o que também reforça o caráter assistencialista da prática é o fato de que a cesta básica é um benefício eventual, a ser distribuído mediante uma situação temporária de emergência.
“ No entanto, em uma cidade que não investe dinheiro público na aquisição de cestas básicas, mas que vive com uma realidade de cerca de 13 mil famílias inscritas nos centros de referências espalhados pela cidade, distribuir o bem, aleatoriamente, tem mais caráter pessoal do que social”, conclui Helena.
O advogado Paulo Soranz, que é ex-secretário de Cidadania do Município, vê uma série de irregularidades nesta ação da Prefeitura. Segundo ele, a entrega de cestas tem que ser justificada.
“Normalmente são pessoas inscritas no Cadastro Único, na linha da extrema pobreza e que por alguma razão procuraram um atendimento emergencial. Às vezes, por uma situação de enchente, violência doméstica, enfim, alguma razão que tenha deixado a família em situação crítica”, explicou.
Soranz lembra que a política de entrega de cestas mudou muito depois do programa Bolsa Família e há ainda outros benefícios de urgência, como o cartão alimentação do Município. Segundo ele, quando alguém realmente procura um serviço de assistência demonstrando uma emergência, não tem conseguido.
“Já para inaugurações têm sido comum. Eu não sei que critérios estão sendo usados pra além do pão e circo. Mas acho que seria bom um questionamento nesse sentido. Quem está recebendo e por qual razão entrou na lista”, sugere o advogado.
A Secretaria de Comunicação da Prefeitura se recusa a atender o Portal Porque para prestar esclarecimentos. Ainda assim, o espaço segue aberto caso o Governo Manga decida dar suas explicações.