
Com a instalação de barracas, banheiros químicos, praça de alimentação e caixas de som, o grupo golpista está gerando um caos na região. Foto: José Jesus Vicente/Repórter Autônomo
O acampamento bolsonarista em frente à base do Exército em Sorocaba, no bairro de Santa Rosália, completa hoje uma semana sem que as autoridades tenham tomado qualquer providência para retirar os golpistas do local. Com a instalação de barracas, banheiros químicos, praça de alimentação e caixas de som, o grupo está gerando um caos na região e pode ter sérios problemas com a Justiça, apesar da benevolência e da inércia das autoridades locais.
Nesta quarta, dia 9, os Ministérios Públicos Estadual e Federal receberam uma representação para investigar e punir os organizadores do ato contra a democracia em Santa Rosália. O autor das ações é o advogado e ex-deputado estadual Raul Marcelo (Psol). Na representação, o advogado pede que o MP instaure um inquérito civil. “Caso o MP acate nosso pedido, o prefeito Rodrigo Manga terá de justificar a omissão sobre a atividade antidemocrática que acontece em Santa Rosália”, explica. Segundo Raul Marcelo, a representação pede que a Guarda Civil de Sorocaba explique por qual razão a avenida Roberto Simonsen segue obstruída; solicita também que a Polícia Militar informe quem são os organizadores do ato.
As representações feitas por Raul Marcelo devem contribuir com as investigações que o Ministério Público de São Paulo está fazendo sobre os atos antidemocráticos que assolaram o Brasil desde a derrota nas urnas do presidente Jair Bolsonaro (PL). Nesta terça, a Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo, junto com representantes dos Ministérios Públicos de Santa Catarina e Espírito Santo, informaram ao ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes que os atos antidemocráticos em curso são chefiados e organizados por empresários.
O PORQUE questionou o Ministério Público se os atos de Sorocaba estão incluídos na investigação, mas a assessoria de comunicação não informou, alegando que o processo transcorre sob sigilo. Entretanto, segundo informações antecipadas pelo próprio procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mario Luiz Sarrubbo, em entrevistas concedidas após a reunião, os integrantes das manifestações fazem parte de “uma grande organização criminosa com funções predefinidas” e atuação interestadual. Um dos objetivos do Ministério Público é mapear o fluxo financeiro que está bancando os atos nos quartéis e os bloqueios nas estradas e rodovias.
Caos em Santa Rosália
A manifestação antidemocrática em frente ao quartel de Santa Rosália está causando distúrbios na rotina dos moradores e das pessoas que trafegam pela região. Nesta terça-feira, dia 8, a fisioterapeuta Kate Prem Pavitra publicou um vídeo em seu canal do Youtube afirmando que sofreu uma coação por parte de um dos manifestantes.
Ela conta que foi levar o filho no Senai e foi hostilizada quando passou pela manifestação. “Fui fazer uma foto e um homem me parou, encarou e perguntou por que eu estava tirando foto, se eu morava ali perto. Me senti intimidada. Até guardei rápido o celular porque não sabia se ia me roubar ou não”, contou ao PORQUE.
Outras denúncias que a redação tem recebido relatam que a região do quartel está tomada por um mau cheiro por conta do lixo acumulado e do banheiro químico. “A gente não consegue fazer caminhada sossegada por ali por medo de ser abordada”, afirma uma trabalhadora da região, que prefere não ser identificada.
Caos na cidade
Além dos atos antidemocráticos no quartel de Santa Rosália, os bolsonaristas sorocabanos que ainda não se conformaram com a derrota nas urnas estão causando um caos em toda a cidade. Na noite desta quarta, dia 9, os golpistas de verde e amarelo voltaram a fazer um ato na rodovia Raposo Tavares e uma carreata que atrapalhou o trânsito em pleno horário de pico.
Nas redes sociais, o grupo também tem atuado, com publicações raivosas e a distribuição de fake news, como um falso “programa comunista” de Lula que está sendo compartilhado pela extrema-direita. Uma professora do curso de direito constitucional de uma faculdade particular de Sorocaba, por exemplo, compartilhou a notícia falsa de que uma auditoria de mídia teria descoberto inserções a mais para Lula durante a campanha. Em outra notícia falsa, ela comenta que “saiu o programa do PT” e compartilha o panfleto falso.
De acordo com o advogado Hugo Bruzi, que é presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB Sorocaba, essa atitude configura crime contra a honra, tipificado no código penal (injúria, calúnia ou difamação). “Isso pode imputar em alguma sanção interna na faculdade, por não respeitar o regimento da faculdade. No mais, ela cometeu evidentemente fatos típicos (crimes), por disseminação de fake news e incitação ao ódio”, ressalta.
Para Bruzi, é lamentável que essa postura seja vista em “uma professora de uma universidade, que tem o dever ético e moral de zelar pela transparência e compromisso com a informação fidedigna aos seus alunos”.
Em resposta ao PORQUE, a faculdade, que fica na região central de Sorocaba, respondeu que “tem um posicionamento neutro e respeita a democracia”. A faculdade diz ainda que “as publicações de professores ou alunos nas redes sociais refletem o pensamento da pessoa e não o da escola”.