
Cerca de 200 funcionários atuam nas quatro unidades da Fundação Casa em Sorocaba; quadro de profissionais estaria defasado em 50%. Foto: cortesia
Em greve desde o dia 3 de maio, os mais de 200 funcionários das quatro unidades da Fundação Casa em Sorocaba estão desesperados e pedem a atenção urgente do governo estadual devido à falta de segurança, de mais funcionários e de estrutura para continuarem trabalhando.
De acordo com um agente socioeducativo que prefere não se identificar por medo de represálias, o quadro de servidores está praticamente todo defasado, desde agentes de operacionais que atuam na limpeza da unidade, até cargos técnicos pedagógicos, psicossociais e de saúde. “Nós, servidores no cargo de agentes de apoio socioeducativos, somos os que mais sofrem com essa defasagem visto que somos nós que ficamos 12 horas por dia cuidando dos adolescentes, garantindo a segurança do centro, bem como a integridade física deles e de todos os demais envolvidos na ressocialização destes menores”, explica.
Em Sorocaba, as unidades trabalham, em média, com apenas 50% do efetivo ideal. O agente cita a indicação do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012) de que unidades como a Casa 1 e 2, ambas presentes em Sorocaba e que comportam 64 adolescentes, precisariam de um efetivo de 13 agentes de apoio socioeducativos, dando uma proporção de um agente para cada cinco internos. No entanto, no dia a dia, são apenas cinco ou seis agentes por plantão completo. Já em unidades que recebem jovens reincidentes e envolvidos em casos graves ou gravíssimos — Sorocaba possui uma –, deveria ser um agente para cada três adolescentes. A casa de reincidentes grave-gravíssimo de Sorocaba comporta 96 jovens e precisaria ter 32 agentes de apoio socioeducativo por dia. Atualmente, são apenas dez agentes por plantão.
“Os internos também são prejudicados pelo baixo efetivo, seja na ausência de atividades de lazer, esportivas e pedagógicas, bem como no atendimento de saúde, já que na falta de profissional destas áreas eles acabam ociosos, ficando na frente da TV, em jogos de tabuleiro ou pingue-pongue o dia todo”, relata o agente.
Com um número baixo de profissionais, os internos estão praticamente sem atendimento de saúde, pois a equipe de enfermagem se encontra defasada e, mesmo se esforçando, não consegue atender a todos. “Fora que não tem enfermagem à noite porque o governo estadual diz não ter orçamento para custear o período noturno, repassando aos coordenadores a obrigação de fornecer medicamento aos internos no período da noite”, completa.
“Estamos sem aumento efetivo há muito tempo. Não temos plano de carreira decente que seja justo. Não temos concurso para o quadro há quase 10 anos. Com inúmeros casos de aposentadoria, falecimento, plano de demissão voluntária, essas vagas não foram repostas. Porém as exigências permanecem como se fosse possível arcar com todas as demandas. No lugar em que eram dez funcionários, hoje temos quatro. A maioria de nós está doente, com problemas clínicos e psiquiátricos”, protesta outro funcionário.
Os funcionários também relatam agressões sofridas dentro e fora das unidades de Sorocaba. Em 2020, um servidor foi agredido no rosto por um adolescente com um cadeado. Mais recentemente, em 2023, um socioeducador foi reconhecido na rua e agredido com um facão por um ex-interno.
Sem estrutura física e itens de higiene
Não são só as equipes de profissionais que estão desestruturadas. As unidades sofrem também com a falta de manutenção básica como torneiras quebradas, falta de dedetização, com relatos de ratos nos refeitórios, baratas nas cozinhas, escorpiões, sapos nas áreas gramadas, pernilongos, entre outros insetos e animais peçonhentos que acabam entrando nas áreas de convívio e quartos dos menores internados. Os jovens também não têm água quente por falta de pressão e manutenção nas tubulações, o que causa vazamentos constantes, inclusive nos dormitórios dos internos.
Não há materiais de higiene básicos como sabonete, rodos, vassouras, sabão em pó, papel-toalha e higiênico. De acordo com um funcionário, os servidores estaduais são obrigados a fazer “vaquinha” para adquirir produtos de qualidade e até para comprar equipamentos de uso comum como bebedouros, fogões e geladeira. Os maquinários não contam com manutenção e no bebedouro dos adolescentes há até lodo nas mangueiras de entrada de água.
Aumento oferecido está bem abaixo das perdas salariais
A paralisação tem como base a pauta de reivindicações do Sindicato da Socioeducação (Sitsesp), que, além do reajuste de 15%, pleiteia o pagamento das perdas acumuladas desde 2000 — que equivalem ao percentual de 40,09% –, a instituição da bonificação por resultado, o cumprimento do plano de cargos e salários, além de vale-refeição de R$ 1.050 e vale-alimentação de R$ 750.
Em entrevista à imprensa, os secretários da Casa Civil, Arthur Lima, e da Justiça e Cidadania, Fábio Prieto, disseram que o governo anterior não havia deixado nenhuma provisão para reajuste, e os 5,75% oferecidos na semana anterior poderiam chegar no máximo a 6%.
Inconformados com o índice, os servidores estaduais permanecem em greve e enviaram uma carta ao presidente da Fundação Casa, João Veríssimo Fernandes, que o Portal Porque publica na íntegra.
“CARTA AO PRESIDENTE DA FUNDAÇÃO CASA
TRABALHADORES DA FUNDAÇÃO CASA, GREVE CONTINUA.
João presidente precisa de algumas informações, então vamos lá:
João vc precisa entender que não adianta apenas dar o tablet pro adolescente, precisa ter os profissionais da educação pra fazer as orientações, fazer o olho no olho, o afeto destes profissionais, sem deixar de ter uma postura firme, isso se chama presença pedagógica.
João, pra convencer um adolescente em sua responsabilidade em relação ao ato infracional, não adianta somente uma sentença, precisa da técnica, que vai nos atendimentos individuais, mostrando pro adolescente que o crime não compensa, isso se chama Equipe Psicossocial.
João se vc acha q o menino chega no centro pulando de alegria, por estar internado, vc está errado, não adianta chamar o suporte, a polícia, o FBI, pq no dia a dia do centro, o menino só vai atender ao comando dos agentes de apoio socioeducativo, por um simples motivo, somente a experiência de um agente e sua vinculação com adolescentes altamente agressivos, é capaz de impor disciplina no chão do pátio, alias; João os AAS são gênios criam metodologias de segurança através da práxis (vamos teorizar um pouco).
Os AAS da base, são os profissionais que deveriam construir um plano de segurança pra instituição.
João vc sabe abrir um cadeado e fechar um cadeado? Tenho certeza que sabe, agora outra pergunta, vc sabe qual o momento de abrir ou fechar um cadeado dentro de um centro de internação? Isso meu caro, vc não sabe; isso só é possível com os AAS, o momento exato de uma ação, só os AAS, isso se chama presenca da SEGURANCA.
Nós, trabalhadores (as) da FC, somos a ala forte da instituição que banca por exemplo o seu cargo e seu alto salário.
Não será esquecido:
Ossos do Ofício;
Saúde Facultativa;
Não tenho Governabilidade.
A Greve continua.”