
Pipas estavam sendo vendidas ao preço “promocional” de R$ 20,00. Para a polícia, comerciante alegou que não sabia que era crime. Foto: Maíra Fernandes
No Dia Internacional contra o Fascismo e o Antissemitismo, celebrado nesta quarta-feira, 9, uma denúncia sobre uma loja popular em Sorocaba comercializando uma pipa com a suástica, maior símbolo do nazismo, culminou na detenção em flagrante do dono do estabelecimento, ocorrida na manhã desta quinta-feira, 10, no bairro Vitória Régia. A ação contou com a presença de forças militares e membros da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/Sorocaba). O comerciante foi encaminhado à delegacia para prestar depoimento.
Apesar de os objetos com símbolos do nazismo estarem expostos para venda à vista de todos, a Polícia dispensou o proprietário da loja. “A delegada competente não entendeu caracterizar o flagrante delito, liberou o proprietário do estabelecimento, e mandou os itens para perícia, e assim, apurar se existiu apologia ao nazismo com a comercialização dos materiais apreendidos. A Comissão de Direitos Humanos continuará diligente e tomará todas as medidas cabíveis para que atos como estes não se perdurem não nossa sociedade”, informou por volta das 16h50 o presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Sorocaba, Hugo Bruzi. A delegada a que Bruzi se refere é Marta Tereza de Oliveira Ayres Cardum.
Foi instaurado um inquérito para averiguar os itens, que vão passar por perícia para ver se remetem à suástica e, comprovado o delito, o comerciante responderá criminalmente.
Nazismo para crianças
A denúncia partiu de uma moradora dos arredores sobre o fato que ocorreu na tarde da quarta-feira, quando ela entrou na loja para compras e se deparou com os objetos, logo identificando o símbolo nazista. De acordo com ela, que preferiu não se identificar temendo danos à sua integridade física, ao questionar o símbolo na pipa foi hostilizada pelo homem que estava no caixa da loja, identificado por ela como sendo o gerente do estabelecimento, dizendo que preferia aquela imagem à imagem do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em uma clara demonstração de se tratar de um elemento de extrema-direita.
“Entrei nessa loja, vi a pipa e perguntei para o caixa: o senhor sabe que símbolo é esse? E ele me respondeu o seguinte: você prefere que eu venda uma com a cara do Lula? Falei que se tratava de um absurdo, pois ele estava incentivando as crianças ao nazismo, à violência e a não democracia, e ele disse que a loja era dele, a pipa era dele e que iria deixar lá para vender”, contou. Antes de sair, a denunciante ainda afirmou que nunca mais voltaria ao estabelecimento, no que ele respondeu que seria “um favor pessoas como eu não ir lá comprar”.
De acordo com ela, ao entrar em um ônibus e narrar o acontecido por celular à reportagem, sofreu, mais uma vez, agressões verbais de pessoas que ouviram o seu relato: “Me disseram: só podia fazer parte dessa corja do PT.” Para ela, é importante denunciar e frear essas incitações e violências que vêm ocorrendo no Brasil, pois acredita que a punição é o melhor modo de as pessoas retomarem a consciência e traços civilizatórios, ou tudo acabará em barbárie. “Não iria denunciar, mas desacreditei no que vi e ouvi. Não podemos aceitar quietos tudo o que está acontecendo de antidemocrático no Brasil.”
Verde, amarelo e suástica
Na manhã de quarta-feira a reportagem esteve no estabelecimento, acompanhando os membros da Comissão de Direitos Humanos da OAB e as forças policias. As pipas ainda estavam expostas para a venda, pelo preço promocional de R$ 20, o que caracterizou o flagrante. O ambiente todo estava decorado de verde e amarelo e com bandeiras do Brasil, inclusive nos uniformes dos funcionários. A polícia chegou até o local e conversou com o gerente e com o dono do estabelecimento, que foi conduzido à delegacia, e o material apreendido.
Em sua defesa, na hora do flagrante, o dono do estabelecimento afirmou que não tinha ideia do que se tratava ou que aquilo era um símbolo, e transferiu a culpa para o fornecedor, que foi ouvido via telefone, mas não chegou a comparecer ao local até a condução do proprietário à delegacia.
Todas as medidas cabíveis
Como reforçou o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, Hugo Bruzi, trata-se do flagrante de um crime denunciado anonimamente à comissão. Assim que tiveram conhecimento e confirmaram a comercialização do item, os membros se reportaram à polícia para que fosse realizada a autuação em flagrante, o que ocorreu. “Tomaremos todas as medidas cabíveis”, reforçou o advogado, que acompanhou todo o processo, lembrando que a apologia ao nazismo usando símbolos nazistas, distribuindo emblemas ou fazendo propaganda desse regime é crime previsto em lei no Brasil, com pena de reclusão de dois a até cinco anos, além de multa, enquadrada na Lei 7.716/1989.