
Passageiros têm de enfrentar, todos os dias, ônibus lotados e, assim, precisam viajar em pé: culpa seria das empresas e das prefeituras. Foto: João Maurício da Rosa/Portal Porque
A criação da RMS (Região Metropolitana de Sorocaba), em 2015, fez com que as empresas de ônibus que conectam os 27 municípios passassem a ter status de linhas suburbanas – antes eram chamadas de linhas regulares. Isso significa a permissão para passageiros em pé, embarque e desembarque em pontos sem abrigo e fiscalização nenhuma.
Desta forma, se a metropolização foi uma mão na roda para as empresas, se tornou um pesadelo para os passageiros. “Isso porque o Conselho da Região Metropolitana está omisso”, afirma o ex-deputado estadual Hamilton Pereira, autor do projeto de lei que criou a RMS.
A empresária Luana Rosa, por exemplo, vem diariamente de São Roque a Sorocaba para trabalhar. Vem no ônibus das 9h e volta às 17h20. Ela faz parte de um contingente aproximado de 35 mil pessoas que viajam, todos os dias, entre Sorocaba e as cidades da região, a chamada população pendular que tem como ponto de partida e chegada as ruas próximas à Rodoviária.
Embora transitem por grandes rodovias estaduais, os veículos que levam e trazem Luana Rosa têm o mesmo modelo que os ônibus urbanos. Isso porque o estatuto da Região Metropolitana alterou a categoria das linhas regionais de “regulares” para “suburbanas”.
Assim sendo, o transporte regional fugiu da jurisdição do Artesp (Agência Reguladora dos Transportes do Estado de São Paulo) e passou para a EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos).
Desta forma, pode-se dizer que a criação da RMS foi uma mão na roda para as empresas de transporte, pois permite veículos econômicos, sem poltronas reclináveis e abre mão de agências e cobradores para a comercialização de passagens. Além do que permite o transporte de passageiros em pé.
Luana só viaja em pé. Ela mora no bairro do Marmeleiro, a 5,2 quilômetros do centro de São Roque, pela Rodovia Raposo Tavares, onde o ônibus sempre passa lotado. E, na volta, em qualquer dos dois horários, mesmo na fila do ponto inicial, ela nunca chega a tempo suficiente para garantir um banco. E a empresa só oferece um ônibus por hora.
Sem os cobradores, segundo Luana, cada parada é uma eternidade. “Se o passageiro não tem cartão o motorista tem de cobrar e fazer o troco. E se não tem troco os passageiros ficam amontoados atrás da catraca até o motorista juntar os trocados”, relata.
Luana está no fim da fila da guarita número 6, uma rudimentar estrutura de madeira instalada rente ao muro da ETEC Rubens Faria e Souza, na Rua Cônego Januário, a uma quadra da Rodoviária.
A estrutura das guaritas, inclusive, é outro problema para a população pendular de Sorocaba. Trata-se de uma armação de carpintaria com telhado de fibra ondulada. Ao todo, são sete abrigos semelhantes circundando a ETEC pela Rua Joubert Way até a esquina com a Rua Pandiá Calógeras, que separa o colégio da Rodoviária.
Ao contrário das guaritas de metal cintilante e painéis digitais informando horários e destinos dos ônibus do sistema BRT (Bus Rapid Transport ou transporte rápido de ônibus), os abrigos da EMTU ostentam um aviso impresso num pedaço de papel grudado ao caibro interno. O banco comporta no máximo quatro pessoas e, se cair uma chuva fina e ventar ao mesmo tempo, o abrigo será tão útil como um guarda-chuvas sob tempestade.
Responsabilidade das prefeituras
De acordo com a assessoria de imprensa da EMTU, os abrigos para ônibus são uma responsabilidade das prefeituras. Mas os passageiros não sabem a quem reclamar. “A população pendular não está recebendo a devida atenção dos dirigentes da RMS”, atesta o ex-deputado Hamilton Pereira.
Ainda de acordo com Hamilton, há um vácuo de governança na RMS por falta de liderança do prefeito de Sorocaba, Rodrigo Manga (Republicanos), que é o presidente do Conselho Deliberativo da Região Metropolitana.
“A RMS foi criada após cinco anos de estudos que demonstraram que a região reúne todas as características exigidas pela legislação. Foram nove anos, entre 2005 a 2014, elaborando o projeto e buscando apoio na Assembleia Legislativa”, lembra.
O ex-deputado estadual conta que o projeto de metropolização de Sorocaba mirou em exemplos do ABC onde os municípios criaram um consórcio de desenvolvimento integrando transportes e aterro sanitário, entre outros objetivos.
“É um absurdo que cada cidade precise inutilizar áreas importantes para depósitos de lixo quando podem ter algo com tecnologia de ponta para aproveitar gás metano, como fez a ex-prefeita de São Paulo, Luiza Erundina. De forma consorciada, os municípios podem buscar soluções comuns para aterros, reciclagem, abastecimento de água e proteção dos mananciais de água potável, por exemplo.”
Politização
O professor Flaviano Agostinho de Lima, doutor em ciências ambientais, economista, advogado e especialista em planejamento regional, atribui as deficiências da metropolização de Sorocaba à politização da Agems (Agência Metropolitana de Sorocaba), autarquia especial criada um ano depois para gerir a RMS.
“Esta autarquia tem 21 cargos que, infelizmente, com poucas exceções, foi até o momento um órgão eminentemente formado por quadros políticos e raros técnicos com conhecimento em planejamento regional”, afirma.
O professor lembra, também, que o Conselho Deliberativo da RMS, formado pelos 27 prefeitos e 27 representantes de órgãos estaduais, é o órgão mais importante, pois é quem delibera as diretrizes de ação. Entretanto, só no ano passado elaborou o PDUI (Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado) que ainda repousa na Assembleia Legislativa aguardando aprovação.
Por esta razão, Flaviano credita a precariedade dos serviços oferecidos como falta de uma política mais clara à população regional e maior oferta de linhas de integração metropolitana. “Quanto mais na borda da RMS está o município, ainda pior e mais caro o serviço oferecido pela EMTU”, ressalta.
“Enfim, a RMS que deveria trazer uma melhora dos serviços públicos metropolitanos de fato, tem ficado muito a desejar. Espero que logo se tenha a aprovação do PDUI e a estruturação efetiva da Agems com quadros técnicos, diminuindo a interferência político-eleitoral, bem como garantindo a participação qualificada da sociedade para cobrar os resultados desses serviços e do planejamento regional”, conclui.