
Unidade de Pronto-Atendimento do Éden é uma das que foram terceirizadas e têm apresentado problemas constantes nos pagamentos dos salários, com reflexos no atendimento à população. Foto: Paulo Andrade/Portal Porque
A terceirização na Saúde Pública municipal tem sido mais um dos motivos de insatisfação dos usuários do sistema e dos profissionais que atendem nas unidades. Desde 2018, a prática foi intensificada pelos governos com o argumento de que haveria aumento da eficiência. No entanto, ao invés de economizar recursos financeiros, o que tem havido é justamente o aumento dos custos e a priorização para os setores de urgência e emergência, em detrimento da saúde básica, que, por ter um olhar mais preventivo, acaba sendo menos onerosa.
Hoje existem 355 médicos concursados trabalhando na rede municipal de saúde. Até 2013, quando os concursos eram realizados com frequência, chegou-se a mais de 700. Acontece que ao longo do tempo muitos profissionais se aposentaram, pediram exoneração ou faleceram. Com uma defasagem de cerca de 300 médicos, a Saúde agoniza e quem sente é a população. Como reflexo dessa defasagem de profissionais, muitos têm que fazer horas extras, o que é mais caro para os cofres públicos, em paralelo aos problemas recorrentes com a contratação de profissionais como pessoas jurídicas (PJ), nas unidades que foram terceirizadas. O mesmo vale para a enfermagem e demais profissionais do setor.
De acordo com o Sindicato dos Médicos de Sorocaba e região (Simesul), a priorização de recursos para as unidades de pronto-atendimento, em detrimento às UBSs, tornou o problema ainda pior. Isso pode ser observado nas planilhas da saúde, segundo o presidente do sindicato, médico Eduardo Luis Cruells Vieira.
A porta de entrada para a terceirização dos profissionais é justamente as unidades de Pronto-Atendimento, que foram terceirizadas. Nas UBSs (unidades básicas de saúde), somente médicos concursados podiam fazer parte do quadro de profissionais. Nos últimos anos, tem-se realizado a contratação de profissionais como PJ que, devido à rotatividade, não costumam criar vínculo com a população como os concursados que permanecem por muitos anos no mesmo local. Nas unidades que foram terceirizadas, a rotatividade é alta e, quando os contratos não são renovados, existe muita troca de profissionais.
“Algumas faltam com sua obrigação de remunerar os profissionais contratados e, depois que saem, deixam o ônus com a Prefeitura”, reforça Eduardo Vieira.
Mesmo sabendo dessa prática, a Prefeitura continua a terceirizar os serviços prestados pelas unidades de pronto-atendimento, como é o caso das UPHs Norte e Oeste e da UPA do Éden. No dia 30 de junho, médicos da unidade protestaram pela falta de pagamento dos salários. A situação é recorrente e já foi alvo de outros protestos dos profissionais da saúde daquela unidade. O assunto foi noticiado pelo Portal Porque nos últimos meses.
Atrasos constantes
Os médicos da UPA Éden ficaram três meses sem receber e, no fim de junho, a terceirizada voltou a atrasar salários de parte dos médicos. Há também denúncias de atraso nos salários do pessoal da limpeza e de benefícios à equipe de enfermagem. A situação motivou a realização de uma força-tarefa formada por auditores fiscais da GRTE (Gerência Regional do Trabalho e Emprego) e procuradores do MPT (Ministério Público do Trabalho) que deve acontecer em breve.
A predisposição da força-tarefa em investigar pagamentos na área da saúde foi reforçada por um pedido formal de fiscalização ao Ministério do Trabalho feito, dia 5 de julho, pelo Simesul.
Tanto o INCS quanto outras terceirizadas e ainda a Prefeitura e a pessoa do prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) podem ser investigados. Segundo informações obtidas pelo Porque, o Governo do Estado teria transferido R$ 10 milhões, em junho, para o Fundo Municipal da Saúde. A Prefeitura teria usado esse valor – ou parte dele – para atualizar os repasses para terceirizadas pagarem salários. Conforme divulgado pela própria Prefeitura, outros R$ 3 milhões foram repassados pelo Governo Federal com destino à Saúde, mas não se diz onde nem como esse valor será aplicado.
Rede desestruturada
A consequência do abandono à rede pública municipal é a sobrecarga para todos os profissionais envolvidos e como o usuário do SUS não consegue ser atendido na Unidade Básica, acaba procurando as unidades de Pronto Atendimento e sobrecarregando todo o sistema. “A prioridade deixa de ser a prevenção de uma doença e passa ser apenas a resolução dos problemas pontuais que se apresentam, mesmo não sendo de urgências”, esclarece o presidente da entidade de classe.
Por meio da terceirização das unidades de saúde, é feita contratação direta de médicos como pessoa jurídica para as UBSs, que é muito ruim pela alta rotatividade dos profissionais que acabam não conseguindo criar um vínculo com a comunidade, como naturalmente acontece com os concursados, que passam a serem reconhecidos pelas comunidades e que estabelecem a relação de confiança entre médico e paciente, tão importante para a aderência ao tratamento.
A solução está na realização de concursos públicos para a contratação de médicos e demais profissionais da saude. “Acredito que, após 10 anos desde a primeira terceirização em Sorocaba, já é possível fazer um balanço de como essa política não foi boa para o município. Além de caras, não são eficazes e com muitas empresas há problemas sérios. O Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP) já tem feito seu papel fiscalizatório e os primeiros resultados não são bons”, finaliza o presidente do Simesul.