Na data em que se celebra o Dia do Orgulho LGBTQIA+, o vereador conservador Dylan Dantas (PSC) protagonizou uma cena de intolerância e abuso de poder, em resposta a uma ação artística ocorrida na Escola Estadual Joaquim Izidoro Marins, e deixou o local debaixo de xingamentos. Dantas foi chamado de “homofóbico” por alunos, que em determinado momento gritaram em coro: “Lixo! Lixo!”.
O vereador, que em sua página no Facebook afirmou ter sido “agredido”, esteve no local, de acordo com sua versão, para atender ao chamado de alguns pais, que participavam de uma ação aberta na escola, e denunciaram um “selinho” ocorrido no final da encenação de um espetáculo teatral. O beijo, segundo o PORQUE apurou, não constava do roteiro da apresentação, tendo sido incorporado pelas próprias alunas-atrizes. Do mesmo modo, o evento foi idealizado para destacar a produção cultural dos alunos, e não em alusão à data.

Entidades analisam medidas cabíveis contra ação qualificada como “surreal”, que deixou professores chorando e estudantes indignados. Vereador tentou filmar os alunos e foi impedido. Em suas redes sociais, afirmou ter sofrido agressão, mas vídeos da passagem tumultuada pela escola não registraram qualquer violência física. (Foto: Reprodução)
Conforme o relato dos presentes no local na hora da intervenção, Dantas chegou acompanhado de assessores, sem solicitar autorização, filmando tudo e, de maneira descrita como hostil, perguntando quem eram a diretora e a professora responsáveis pela encenação. “Eles entraram na sala da diretora inquirindo, querendo saber o responsável pelo espetáculo, e a professora saiu de lá chorando”, conta uma das fontes, que preferiu não se identificar. De acordo com essa testemunha, ao perceberem a truculência da intimidação do vereador e o estado em que a professora saiu da conversa, os alunos se indignaram, se organizaram no corredor de acesso, e receberam Dantas com palavras de ordem, xingamentos, pedidos para que se retirasse e acusações de homofobia.
Na saída, sob os protestos dos alunos, um dos assessores de Dantas começou a filmar a manifestação, mas foi barrado por um professor, que lembrou aos visitantes que se tratava de menores de idade e, por isso, seria ilegal produzir imagens deles sem autorização dos pais ou responsáveis. O professor conta que colocou a mão no celular do assessor e pediu que ele parasse. Logo em seguida, o próprio vereador começou a filmar, e o professor procedeu do mesmo modo, o que gerou um bate-boca. No entanto, ele afirma não ter encostado no vereador, que usou as redes sociais para denunciar que havia sido agredido por “sindicalistas”. “Na saída da sala fui hostilizado por sindicalistas e um monte de gente que gritavam (sic) palavras de ordem. Tentaram tomar meu celular quando comecei a gravar a agressão seguida de empurrões e tapas na mão. É preciso ressaltar que com a direção não houve problemas, a conversa foi produtiva”, escreveu Dantas.
Em um dos vídeos que o próprio vereador divulgou em suas redes socais, é possível ver um professor solicitando que parem de gravar, quando um dos assessores ameaça chamar a polícia. Em resposta, o professor diz para que chamem, pois é proibido a filmagem de menores de 18 anos sem autorização dos responsáveis. De acordo com os presentes, a polícia chegou a ir até o local, atendendo à solicitação do vereador. Nos vídeos que correram as redes sociais, não é possível identificar qualquer cena de agressão; o que ficou registrado foi um grupo de estudantes gritando “Lixo! Lixo!” e “Vaza!”, enquanto Dantas, que estava sério até então, sorriu e encenou uma mesura, à guisa de agradecimento. Em dado momento, já quando deixava o estabelecimento, o vereador teve que ouvir um sonoro “vai procurar sua turma”.
ENTIDADES REPUDIAM AÇÃO DO VEREADOR
Para dar apoio aos docentes e discentes envolvidos e questionar a postura de Dantas, a comunidade escolar convocou a presença das vereadoras Fernanda Garcia (Psol) e Iara Bernardi (PT), além das comissões da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e representantes do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), que também foram para a unidade, a fim de acompanhar os desdobramentos da ação do vereador.
De acordo com Fernanda Garcia, Dantas teve uma postura “autoritária” e arbitrária, dentro de um local cuja missão é a de combater todos os tipos de intolerâncias e preconceitos. “Se tratava de uma atividade artística, onde as meninas estavam representando, e o vereador faz um questionamento de forma agressiva”, fala ela, reforçando que o ato do vereador foi uma clara tentativa de assédio aos professores.
Ainda conforme informações da vereadora, as entidades representativas presentes, bem como os vereadores, irão avaliar quais medidas serão tomadas diante do episódio.
Para a vereadora Iara Bernardi, autora do PL 122/2006, o “Projeto anti-homofobia”, que foi referência para que o STF enquadrasse o preconceito contra as pessoas LGBTQIA+ dentro do crime de racismo, em um dia festivo para aquela unidade escolar, não fazia sentido a presença de Dantas tumultuando o ambiente, coagindo e constrangendo os profissionais, para fiscalizar algo que nem é da competência do parlamentar. “Vereador não tem que ficar investigando escola estadual. A passagem dele foi extremamente negativa, os professores ligaram chorando, indignados, e ele ainda os ameaçou. Não tem sentido isso”, criticou a vereadora, classificando o episódio como homofobia.
Representando o Conselho Municipal dos Direitos das Crianças e Adolescentes da Ordem dos Advogados do Brasil, Hugo Bruzi, advogado que também esteve no local após o tumulto, classificou como “surreal” e “autoritária” a ação do vereador Dylan Dantas. “Dialogamos com professores que tiveram cerceada sua atuação e liberdade de cátedra, bem como com a direção da escola e representantes do Legislativo. Averiguamos vídeos, áudios e testemunhos dos fatos, e medidas cabíveis serão tomadas para combater esse ato abusivo e arbitrário do vereador”, afirmou.