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Em silêncio, aliados de Manga enterram CPI da Educação com relatório ‘ensaboado’

Na surdina, comissão de vereadores que apoia o prefeito entrega documento inconclusivo e repassa a responsabilidade de apuração ao Ministério Público

Paulo Andrade (Portal Porque)*

Cláudio Sorocaba (à direita), presidente da Câmara e aliado de Rodrigo Manga, vai ter de explicar, em juízo, motivos que o levaram a rejeitar o pedido de CPI da oposição. Foto: Reprodução/Facebook Cláudio Sorocaba

Sem nenhum alarde, os vereadores aliados do prefeito de Sorocaba, Rodrigo Manga (Republicanos), encerraram, na semana passada, a CPI que deveria apurar os contratos suspeitos da Sedu (Secretaria Municipal de Educação). A Comissão Parlamentar de Inquérito, montada há seis meses com o objetivo de barrar a CPI solicitada pela oposição, não chegou à conclusão nenhuma.

Em tese, a Comissão deveria investigar denúncias, como superfaturamentos na compra do prédio da Sedu, dos kits de robótica, uniformes escolares e brinquedos inclusivos, entre outros. No entanto, foi concluída na quinta-feira (6) passada sem que a Câmara ou os membros da CPI divulgassem qualquer informação sobre o seu fim.

Nem mesmo os vereadores da oposição sabiam do término das apurações e foram informados pelo Portal Porque. A reportagem descobriu que os trabalhos da Comissão tinham sido concluídos ao acessar o processo judicial que apura a possível compra superfaturada do prédio da Sedu e, assim, encontrar o relatório final.

Após seis meses de investigação, a CPI não chegou a nenhuma conclusão sobre as irregularidades que deveria investigar e, agora, deve encaminhar o processo ao MP (Ministério Público).

“No nosso relatório, a gente sugere que a investigação continue. Por isso, vamos enviar nosso relatório para o MP e para o Gaeco [Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado] para que eles possam trazer mais clareza também à população”, diz o presidente da Comissão, o vereador Vinícius Aith (PRTB).

Na época da instalação, no fim do ano passado, a CPI foi chamada de chapa branca por ser composta apenas por apoiadores de Manga. Ela foi solicitada por João Donizeti (PSDB), que é líder do prefeito na Câmara e composta, exclusivamente, pela base aliada, com Aith na presidência e Dylan Dantas (PL) como relator. Essa CPI inviabilizou a criação de uma outra, sobre o mesmo tema, proposta pelos vereadores da oposição naquele mesmo dia (clique aqui para relembrar este caso).

Ao Porque, Aith admitiu que a CPI não teve competência para chegar a uma conclusão. “O Gaeco tem muito mais poder de investigação do que nós aqui da Câmara Municipal. Nós não temos um setor de inteligência, não temos o poder de escuta, de grampear telefones. Agradecemos muito ao MP e ao Gaeco por terem aceitado compartilhar a ação com a gente [fornecendo documentos]. Agora, estamos retribuindo essa gentileza também encaminhando nossa documentação a eles.”

Saindo pela tangente

Perguntado sobre os indícios de preços altos nas compras da Prefeitura, que, no caso dos kits de robótica já resultou no bloqueio de bens do prefeito e no afastamento do secretário de Educação, Aith respondeu: “A gente precisa deixar isso muito claro e eu sempre frisei muito bem isso em todas as entrevistas: qual o objeto de uma CPI? Pra que ela serve? Existe a CPI e o processo pós-CPI. Por isso decidimos encaminhar ao MP e, se o órgão achar que deve, encaminha o caso à Justiça”.

Sobre uma eventual culpa da Prefeitura ou do prefeito nas compras suspeitas, o vereador do PRTB novamente se apegou à falta de “condições e poderes” para a CPI investigar ou julgar se existem indícios. “A CPI não confirma nem nega [culpa], ela procura contribuir com instituições, como MP e Justiça, que já estão investigando. Nós não somos juízes para culpar uma pessoa ou outra. Depois de transitado em julgado, alguma pessoa vai ser culpada, a Prefeitura ou alguém relacionado à Prefeitura.”

Dois pesos, duas medidas

A alegação de Aith sobre a falta de condições e de poderes da Comissão para apontar irregularidades e culpas contradiz com outra CPI que ele presidiu, a dos Livros, em 2022, contra a ex-prefeita Jaqueline Coutinho (MDB). O relatório final dos trabalhos, em abril daquele ano, apontou irregularidades na compra de livros paradidáticos, pediu ao MP que abrisse uma ação civil pública de improbidade administrativa contra a ex-prefeita e ainda sugeriu outra ação por crime de responsabilidade.

Nesta CPI, o vereador chegou a acionar a Guarda Civil Municipal para intimar Jaqueline em sua casa, às 6h. Ela foi interrogada no plenário da Câmara, aberto, e não em salas fechadas como ocorreu com todos os depoimentos da CPI contra Manga. Na época, a ex-prefeita declarou que foi “constrangida” pela Comissão também presidida por Aith.

CPI focou no prédio e relegou outras denúncias

A CPI da Educação no governo Manga, que durou seis meses, compartilhou informações com o Ministério Público, que já investigava, via Gaeco, algumas das irregularidades denunciadas, inclusive encaminhando casos à Justiça, que, no que diz respeito ao kit robótica, afastou o secretário de Educação, Márcio Carrara, e, recentemente, bloqueou bens do prefeito.

Aith afirmou ao Porque, porém, que teve acesso a contratos sobre o kit robótica e demais denúncias ligadas à educação, mas a CPI resolveu priorizar a compra o prédio da Sedu, no Campolim, que, segundo denúncias, valia cerca de R$ 20 milhões, mas foi comprado por R$ 30 milhões pela Prefeitura.

“Como no momento da CPI o debate era muito relacionado à compra do prédio [da Sedu], os vereadores e a população estavam muito preocupados com relação a isso, nós focamos mais em investigar essa questão”, explica. Ele disse ainda que, somente sobre esse assunto, a Comissão ouviu mais de 15 depoimentos e fez diligências, além de estudar informações que obteve junto ao MP.

Aith também admitiu que a CPI que ele presidiu era muito ampla (musicalização, uniformes, brinquedos, prédio, kits robóticas, entre outros contratos). “A gente poderia ter acesso a qualquer contrato junto à Secretaria de Educação, do ano de 2021 até a época em que foi aberta a CPI. Não é que nós não quisemos investigar a fundo todas as questões, o período hábil para que nós fizéssemos isso era muito pequeno. A Comissão foi instaurada em dezembro, mas teve recesso e ela passou a atuar efetivamente em janeiro deste ano.”

Superfaturamento do prédio

Questionado sobre o valor real do imóvel e a suspeita de superfaturamento de R$ 10 milhões, o presidente da CPI afirmou que o relatório sugere que o próprio Ministério Público faça uma avaliação financeira do imóvel. ‘Nós pedimos [no relatório] que seja feita uma avaliação por um perito criminal para estimar o valor desse prédio. Nós íamos fazer essa estimativa na CPI, mas não havia tempo para fazer licitação, contratar alguém de fora, independente, para avaliar o imóvel”, alega.

De acordo com o vereador, o processo todo da CPI tem cerca de duas mil páginas. Só o relatório de apresentação tem 38. “Como é de praxe, encerramos a CPI, entregamos ao presidente da Câmara, que vai encaminhar ao MP. Vamos ler um trecho do relatório para o plenário [em data a ser agendada] para encerrarmos o processo.”

Presidente assina intimação

Por sua vez, o presidente da Câmara, Cláudio Sorocaba (PL), disse ao Porque que assinou, no dia 6, a intimação da Justiça (Vara da Fazenda Pública de Sorocaba) para explicar o porquê de ter rejeitado uma CPI, sugerida pela oposição, que pretendia investigar exclusivamente a compra milionária e a suspeita de superfaturamento do prédio da Sedu, no Campolim.

Cláudio disse que vai explicar em juízo porque acatou a CPI mais ampla articulada pelo governo por meio de seu líder na Câmara, João Donizeti, e rejeitou a criação da Comissão requerida pela oposição para investigar a suspeita de superfaturamento.

O processo que defende uma CPI com participação da oposição era encabeçado por Iara Bernardi (PT) e subscrito por Cícero João (PSD), Francisco França (PT), Fernanda Garcia (PSOL), Rodrigo Treviso (União), Péricles Regis (Podemos) e Hélio Brasileiro (PSDB).

* Colaborou: Fábio Jammal Makhoul

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