
Lula durante visita à Espanha, nesta quarta-feira (26), com o presidente Pedro Sánchez, no Palácio de Moncloa, em Madri.Foto: Ricardo Stuckert
Depois do discurso na Assembleia Portuguesa, quando foi aplaudido de pé, mas também vaiado por uma minoria da extrema-direita lusitana, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva valeu-se do bom humor para discursar em sua visita à Espanha nesta quarta-feira (26), depois de se reunir com o presidente de Governo, Pedro Sánchez, no Palácio de Moncloa, em Madri. A viagem à Península Ibérica é a primeira que Lula faz à Europa no terceiro mandato.
“Você sabe que eu aprendi que palmas e vaias alguém tem que puxar, alguém tem que ser o primeiro”, afirmou, dirigindo-se a Sánchez. “Porque as pessoas ficam com vergonha de bater palmas, e as pessoas ficam com vergonha de vaiar. É só alguém começar que todo mundo consegue aplaudir. Então vocês, por favor, batam palmas”, pediu. E foi atendido.
Durante a visita, que se encerra ainda hoje, Brasil e Espanha assinaram três documentos:
- um memorando entre os ministérios da Educação dos dois países que amplia a cooperação entre universidades, em questões como aumentar as vagas de intercâmbio no ensino superior;
- um memorando entre os ministérios do Trabalho;
- uma carta de intenções entre os ministérios de Ciência, Tecnologia e Inovação de ambos os países, para cooperação em saúde, meio ambiente e transição energética, entre outros.
Reciprocidade
“Nós conversamos sobre a retomada do diálogo e da cooperação. O Brasil tem uma dívida de gratidão com a Espanha, segundo país que mais investe no Brasil”, disse Lula. Segundo ele, mais de mil empresas espanholas estão no Brasil e cerca de 15 milhões de espanhóis ou descendentes de espanhóis vivem no país.
O chefe de Estado brasileiro afirmou que seu governo não vai mais privatizar empresas, mas quer “construir parceria com empresários de outros países para fazer coisas novas”.
O líder espanhol afirmou, no Twitter, que os dois países abriram “nova etapa nas relações estratégicas”. “Temos muito que levar para a prosperidade e bem-estar de nossos cidadãos, para a aproximação de nossas regiões e para a construção de um mundo mais seguro e sustentável”, escreveu.
Pedro Sánchez também postou uma mensagem contra o negacionismo “suicida”. “Espanha e Brasil compartilham a defesa do meio ambiente contra a negação cega e suicida. Apostamos na ciência, contra os antivacinas. Pelo valor da civilização, contra a barbárie. Pela democracia e pelo estado de direito. obrigado, @LulaOficial.”
Guerra na Ucrânia
Em tom pacificador, Lula falou bastante sobre a guerra na Ucrânia. “Não cabe a mim decidir de quem é a Crimeia. Quando se sentar em uma mesa de negociação, pode-se discutir qualquer coisa, até a Crimeia. Mas quem tem que discutir isso são os russos e ucranianos”, disse.
Dentro da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), nem os países da Europa ocidental, nem os Estados Unidos, e nem a própria Ucrânia, pelo menos nos discursos, admitem que a Crimeia seja incorporada definitivamente pelos russos.
A península foi ocupada por Moscou em 2014, após um golpe pró-ocidente que derrubou o então presidente ucraniano Viktor Yanukovych, aliado do russo Vladimir Putin. A mídia pró-ocidente diz que “a reconquista da região é inegociável para o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky”. Ao mesmo tempo, é menos enfática para lembrar que Putin não admite tal hipótese.
“Acho que ninguém está falando em paz no mundo. Não tem ninguém, a não ser eu que estou gritando paz, como se estivesse isolado no deserto”, disse Lula. “Já falei em paz com o Biden, com o Olaf Scholz, com o Macron, fui conversar com Xi Jinping, falei com o presidente Pedro, com o presidente e o primeiro-ministro de Portugal“, continuou.
Conselho de Segurança
Lula voltou a criticar a atual estrutura do Conselho de Segurança da ONU e sua posição sobre a guerra. “Nós vivemos num mundo muito esquisito, em que os membros do Conselho de Segurança da ONU, todos eles são os maiores produtores e vendedores de armas do mundo, e os maiores participantes de guerra.”
“Por que a Espanha, o Brasil, o Japão, a Alemanha, a Índia, a Nigéria, o Egito, a África do Sul não estão [no conselho]?”, questionou. O Conselho de Segurança foi fundado em 1946 e tem cinco membros permanentes com direito a veto, considerados os vencedores da Segunda Guerra: Estados Unidos, China, França, Inglaterra e Rússia.
“Quando os Estados Unidos invadiram o Iraque, não houve discussão no Conselho de Segurança. Quando França e Inglaterra invadiram a Líbia, não houve. E agora, a Rússia que é membro fixo do Conselho, também não discutiu”, lembrou Lula.
Segundo ele, “a geografia do mundo mudou, a geopolítica mudou”. Por isso, “precisamos construir um novo mecanismo internacional que possa fazer coisas diferentes”.
Amazônia
O presidente também falou sobre a Amazônia, afirmando não querer transformá-la “em um santuário da humanidade”. “O que queremos é transformar aquele território, que é soberano do Brasil, em um centro de pesquisa para que pesquisadores do mundo inteiro possam pesquisar a riqueza da nossa biodiversidade”.
A ideia expressa por Lula sobre a região amazônica é “gerar emprego para as 25 milhões de pessoas que moram lá”, explicou, “sem que a gente use a derrubada de árvores como pretexto para o progresso”.