
Ministério Público dá dez dias para que o governador Tarcísio de Freitas explique, entre outras coisas, porque não consultou professores, diretores e pais. Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), deverá responder por improbidade administrativa ao vetar os livros didáticos sem custo do Governo Federal e preferir gastar com a produção e impressão de material digital próprio. A informação é do deputado estadual Carlos Giannazi (Psol), que reuniu especialistas, professores, autores e outros parlamentares para debater a intenção do governador e seu secretário de Educação, o empresário do setor de informática Renato Feder, anunciada há uma semana.
Em audiência pública na noite de segunda-feira (7), o parlamentar afirmou que seu mandato iria ingressar, ainda nesta quarta-feira (9), com ação popular por improbidade no TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo). “Tarcísio disse que vai imprimir o material [próprio] do Estado. Isso é improbidade administrativa porque temos o material todo pronto pelo Governo Federal, sem custo, reconhecido e adotado até por grandes escolas particulares”, diz.
Para o parlamentar, pode haver interesse econômico ou ideológico – ou ambos – envolvidos na decisão de abrir mão de livros do PNLD (Programa Nacional do Livro Didático), do MEC (Ministério da Educação). Com o recebimento dos livros, escolhidos pelos professores, o Estado deixa de gastar cerca de R$ 200 milhões.
Por isso, a projeção é de que Tarcísio gaste pelo menos este valor para produzir seu material. “O Ministério Público pode levar tudo isso em conta e transformar um inquérito já aberto em ação civil pública”, afirma, se referindo a uma investigação aberta, semana passada, a partir de representação de seu mandato. O MP deu dez dias para o governo explicar, entre outras coisas, porque não consultou professores, diretores e pais.
Diante da rejeição, governo Tarcísio recua, mas só piora
Após a repercussão negativa da medida anunciada, cujo repúdio uniu todos os setores e resultou em inquéritos também no TCE (Tribunal de Contas do Estado), o governo se viu acuado e passou a recuar. Chegou a dizer que as escolas imprimiriam o material para alunos que quisessem. Todas as entidades representativas dos profissionais da educação já se manifestaram contra.
“Em tese, o governo está enfraquecido e recuando, mas cada vez que recua, só piora, porque não consegue justificar a medida adotada”, comenta Giannazi.
A presidente do Sindicato dos Supervisores de Ensino da Rede Estadual (Apase), Rosaura Almeida, reforçou que a medida anunciada pelo governo é mesmo indefensável. Conforme destacou, os livros didáticos distribuídos pelo MEC, além da qualidade pedagógica reconhecida, têm grande importância para a organização do trabalho dos professores.
Acesso aos livros é direito dos alunos
Mas não é só isso. “Ninguém aqui está negando as novas tecnologias, que são bem-vindas. Todos querem o acesso a elas. Tanto que muito se fala em wi-fi livre para toda a população. Mas a discussão é outra: não à precarização ainda maior daquilo que já se tem, para que os alunos tenham acesso ao currículo nas mais diversas formas”, ressalta a especialista em educação, que espera que o governo volte atrás. “Não dá para lesar toda uma geração com uma decisão irresponsável. É um direito dos alunos o acesso aos livros.”
Para o diretor da Câmara Brasileira do Livro, Henrique Farinha, o governo Tarcísio desconhece a situação das escolas paulistas. Dados de 2022 de um painel de conectividade das escolas, publicado pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), aponta que das 18.942 escolas estaduais no país, segundo o Censo Escolar, 10.161 não têm sequer laboratório de informática. “Mesmo que tivesse justificativa pedagógica [para o veto aos livros didáticos], que não tem, faltaria condições”, acrescenta.
Farinha chamou atenção para outro aspecto: “Não se sabe a autoria desse material, se foi avaliado, quem avaliou. Não se sabe sabe a linha pedagógica, o impacto da tecnologia sobre os estudantes. Essa pseudoproposta não tem critério técnico nenhum. O que a gente desconfia é dos interesses que envolvem a proposta. Estamos em defesa do livro e também da educação.”
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