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Sob o comando de Derrite, mortes causadas pela Polícia Militar aumentam 26%

Dados do primeiro semestre ainda não levam em conta a operação em andamento na Baixada Santista, que já deixou 16 mortos; comandante sorocabano tem acompanhado e comemorado ação no Guarujá

Fábio Jammal Makhoul (Porque)

A ação na Baixada Santista, acompanhada de perto e comemorada por Derrite, já é considerada a mais violenta da PM paulista desde o massacre do Carandiru, em 1992. Foto: Reprodução/Facebook Capitão Derrite

Afastado do efetivo da Rota (Rondas Ostensivas Tobias Aguiar), o grupo de elite da Polícia Militar, por ter matado muita gente durante as ações, o sorocabano Guilherme Derrite, agora no comando da PM do Estado, tem colocado em prática sua filosofia de que policial bom deve ter, ao menos, três homicídios nas costas.

Em seu primeiro semestre como secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, cargo que assumiu em 1º janeiro, ele elevou em 26% o número de mortes provocadas por policiais militares em serviço. Foram 155 mortes causadas pela Polícia Militar neste ano, diante das 123 registradas no mesmo período do ano passado.

Os dados são da própria Secretaria de Segurança comandada por Derrite e consideram apenas o primeiro semestre. Ainda não foram registradas, por exemplo, as 16 mortes causadas nos últimos dias pela polícia no Guarujá, durante a Operação Escudo, realizada após o assassinato do policial Patrick Bastos Reis, integrante da Rota, a mesma tropa em que o sorocabano fez carreira antes de se destacar como defensor do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas redes sociais e ser eleito deputado federal.

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo se defendeu, alegando que os números do primeiro semestre “mostram que a principal causa das mortes decorrentes de intervenção policial não é a atuação da polícia, mas, sim, a opção do confronto feita pelo infrator”. Ainda segundo a pasta, os casos dessa natureza são “rigorosamente investigados pelas respectivas corregedorias, encaminhados ao Ministério Público e julgados pelo Poder Judiciário”.

Os números ostentados pela gestão Derrite na Segurança Pública de São Paulo estão acima do patamar indicado por especialistas para apontar excessos na letalidade policial. Segundo reportagem do site Ponte Jornalismo, ONG que debate os direitos humanos, o número de homicídios dolosos segue em queda em São Paulo, passando de 1.454, no primeiro semestre do ano passado, para 1.391 (-4,3%) no primeiro semestre de 2023.

A reportagem aponta ainda, segundo estudos de especialistas, que a proporção ideal é de no máximo 7% de mortes pelas polícias em relação ao total de homicídios. A polícia paulista de Derrite tem índice de 13,7%, ou seja, quase o dobro.

Quem é Derrite

Em sua primeira entrevista como titular da Secretaria da Segurança de São Paulo, em 4 de janeiro, o PM da reserva Guilherme Muraro Derrite disse que sua gestão iria rever o programa de câmeras corporais da Policia Militar, o “Olho Vivo”.

Implantadas pela PM paulista em 2020, as câmeras, que gravam todo o turno de serviço, causaram uma queda de mortes em confrontos policiais de 85% nos batalhões que aderiram ao programa. Com a repercussão negativa, o sorocabano voltou atrás e não falou mais em retirar as câmeras dos uniformes dos policiais.

Aos 38 anos, Derrite é um policial aposentado, que fez carreira na Rota, a tropa de elite da PM paulista conhecida pela letalidade nas ações. Mesmo fazendo parte de uma unidade famosa pela violência, ele foi afastado do efetivo da Rota, em 2013, em razão do grande número de confrontos e de pessoas mortas em serviço. Em um canal do Youtube, em maio de 2021, já como deputado federal, o sorocabano explicou sobre seu afastamento. “A real? Porque eu matei muito ladrão”.

Em entrevista à Folha, no início deste ano, Derrite afirmou não se lembrar da quantidade de pessoas que ele matou durante confrontos em seus 16 anos de serviços prestados à PM. Ele, no entanto, já defendeu que é “vergonhoso” para um policial não ter ao menos “três ocorrências” por homicídio no currículo. O áudio foi revelado em junho de 2015 pela Ponte Jornalismo.

Nascido em Sorocaba, em 1984, Guilherme Derrite começou a carreira como militar em 2003. Ele se tornou 1º Tenente da PM em 2010, quando assumiu o comando da Rota e ficou até 2013. Também fez parte do Corpo de Bombeiros e foi eleito deputado federal pelo Partido Progressista (PP) em 2018, após ficar famoso nas redes sociais por repetir o discurso de extrema direita do então candidato a presidente do Brasil, Jair Bolsonaro.

Em sua atuação como parlamentar, Derrite foi autor e co-autor de 364 propostas legislativas. No campo da segurança pública, ele se destaca com projetos que retiram direitos dos presos e ampliam os poderes da polícia. Entre as propostas do deputado está o fim da visita íntima aos presos. Ele também foi relator do projeto que acaba com as saidinhas temporárias de presos.

Além de retirar os direitos dos detentos, os projetos do sorocabano como deputado também miraram os direitos da população LGBTQIA+. Um deles estabelece o sexo biológico como critério exclusivo para definição de gênero em competições esportivas, vedando a participação de atletas transgêneros em categorias que não correspondam à identificação de sexo atribuída em seu nascimento.

Fazendo história

Agora como secretário de Segurança Pública, Derrite está fazendo história ao aumentar a letalidade da Polícia Militar em 26%. Número que vai piorar muito, quando entrarem nas estatísticas as mortes causadas nos últimos dias pela polícia, na Baixada Santista. A ação já é considerada a mais violenta da PM paulista desde o massacre do Carandiru, em 1992, episódio que terminou com a morte de 111 detentos após rebelião no presídio.

Com 16 mortes registradas até agora, a ação na Baixada Santista já superou a Operação Castelinho (12 mortes, em 2002) e os massacres de Guararema (11 mortes, em 2019), Caraguatatuba (10 mortes, em 2014) e Várzea Paulista (9 mortes, em 2012).

A atuação dos agentes de segurança na Baixada Santista será investigada pelo Ministério Público, que designou três promotores para analisar a legalidade da operação. Moradores da região afirmaram que policiais torturaram e mataram ao menos um homem e prometeram assassinar 60 pessoas em comunidades do Guarujá.

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