
As medidas de Bolsonaro “tiveram fim eleitoral” e não possuem “nenhuma lógica econômica”, diz ex-diretor do Banco Central. Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil
Um levantamento do Valor Fiscal, produzido pelo jornal Valor Econômico, mostra que as medidas lançadas pelo governo de Jair Bolsonaro (PL), de aumentar despesas sociais a poucos meses da eleição para tentar angariar votos, terão um impacto direto de pelo menos R$ 68,38 bilhões nos cofres da União até o fim deste ano. E a tendência, de acordo com a reportagem divulgada nesta sexta-feira (21), é que a manobra do governo federal deixe um rombo nas contas públicas de 2023.
Parte das ações foi implantada ainda por meio da Emenda à Constituição (EC) 123, apelidada, durante sua tramitação no Legislativo, em julho, de PEC Kamikaze, PEC das Bondades e PEC Eleitoral. A medida permitiu que, a apenas três meses da eleição, fosse aberto um espaço no chamado “teto de gastos” que, desde 2016, vem limitando investimentos sociais, para que o governo Bolsonaro pudesse viabilizar cortes de impostos e novos benefícios sociais, como o Auxílio Brasil de R$ 600.
Após três anos e meio de um governo desastroso, o candidato do PL, que aparece atrás nas pesquisas eleitorais e pode ser o primeiro presidente não reeleito da história do país, vem fazendo jorrar recursos públicos para garantir sua recondução ao cargo. Mas, conforme reportou a Rede Brasil Atual, parte dos eleitores já percebem a manobra eleitoreira. Nessa quinta (20), por exemplo, internautas emplacaram ao longo de todo o dia o termo “Eleição Comprada” entre os assuntos mais comentados do Twitter.
Nenhuma lógica econômica
O levantamento mostra ainda que, nesta reta final das eleições, R$ 87 bilhões foram oferecidos em créditos para as micro e pequenas empresas, que puderam também renegociar R$ 20 bilhões em dívidas tributárias. Assim como trabalhadores tiveram a oportunidade de sacar R$ 30 bilhões do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Além disso, os beneficiários do Auxílio Brasil ganharam permissão para tomar empréstimos consignados usando o benefício como garantia, com as operações chegando a R$ 1,8 bilhão no início desta semana.
Bolsonaro também passou a prometer recentemente o pagamento do 13º do Auxílio Brasil para mulheres, em 2023, caso seja reeleito. O governo também prevê seguir com a desoneração de combustíveis e o Auxílio Brasil no valor de R$ 600. No entanto, apenas a desoneração é prevista, sob o custo de R$ 52,9 bilhões, conforme consta no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA). Já o benefício social é apontado em apenas R$ 405, e elevá-lo para R$ 600 exigiria investimentos de R$ 52 bilhões.
Especialistas alertam, no entanto, que o futuro das contas públicas é uma incógnita para 2023 diante dos custo das decisões e da falta de fontes de financiamento. Um ex-diretor do Banco Central consultado pelo Valor Econômico, que não quis se identificar, diz que as medidas de Bolsonaro “tiveram fim eleitoral” e não possuem “nenhuma lógica econômica”. A economista-sênior da LCA Consultores, Thaís Zara, também avalia que as ações tiveram “um caráter mais eleitoreiro”. E que “há muita coisa que pode dificultar a situação das contas públicas no ano que vem”, quando o Brasil discutirá um novo arcabouço fiscal.
Medidas eleitorais
O sócio e economista-chefe da Ryo Asset, Gabriel Leal de Barros acrescenta que as medidas do governo federal também prejudicaram os cofres dos Estados e municípios em até R$ 245 bilhões em 2023, prevê.
O candidato da coligação Brasil da Esperança à presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que enfrentará Bolsonaro no próximo dia 30, tem denunciado reiteradamente os abusos com dinheiro público cometidos pelo seu adversário. A área jurídica da campanha do petista também reclama da falta de atuação do Ministério Público Eleitoral.
À RBA, a professora de ciência política Mayra Goulart, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), destaca que Bolsonaro tenta ganhar na base da “eleição comprada”. Para a especialista, o candidato à reeleição inaugurou uma “nova dinâmica”, em termos de utilização da máquina pública para fins eleitorais.