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Servidora aponta déficit na Votoprev e é ‘removida’ para função no cemitério

Mônica Fida presidiu a previdência municipal até maio deste ano; ela vinha criticando a 'omissão' da Prefeitura quanto à saúde financeira da instituição; a transferência da funcionária deu origem a uma carta de repúdio contra a prefeita Fabíola, assinada até pelo seu vice

Paulo Andrade (Portal Porque)

Depois de denunciar um rombo que ameaça as finanças da seguridade municipal de Votorantim, a servidora Monica foi transferida para um escritório infestado de baratas no cemitério municipal. Fotos: acervo pessoal (esq.)/Gazeta de Votorantim (dir.)

Após afirmar, publicamente, que a Votoprev (Fundação de Seguridade Social de Votorantim) só tem verbas para pagar aposentadorias e pensões por mais alguns meses, Mônica Fida, ex-presidente da instituição, foi transferida pela prefeitura, esta semana, para trabalhar no cemitério da cidade. A atitude da prefeita Fabíola Alves foi classificada como perseguição por lideranças políticas locais.

Mônica Garcia Fida, funcionária pública municipal, escriturária admitida por concurso em 2006, presidiu a Votoprev de janeiro de 2021, mesmo mês da posse de Fabíola Alves Pedrico (PSDB), até maio deste ano.

Com salário de R$ 10,4 mil, devido às funções que ocupou na carreira, Mônica vinha alertando a prefeita que a Fundação tinha um “rombo orçamentário” causado pelo não cumprimento de uma lei municipal instituída 16 anos antes, em 2005.

A lei em questão é a 1830/2005, que atende requisitos federais e prevê um instrumento chamado “segregação de massas” para equilibrar o caixa de RPPS. A sigla identifica regimes de seguridade social adotado por entes federativos com autonomia política e administrativa, como Estados e municípios. É o caso da Votoprev.

A “segregação de massas” é uma divisão dos segurados do RPPS em dois grupos administrativos: o Plano Financeiro e o Plano Previdenciário. “O Plano Financeiro é custeado pela Prefeitura, enquanto o Plano Previdenciário é financiado pelo RPPS”, explica Mônica Fida.

Nesta terça-feira, 18, Mônica obteve afastamento médico do serviço até sexta-feira, pois teve crises e ansiedade e de choro no trabalho. “São muitas baratas e moscas circulando no escritório do cemitério. É um ambiente totalmente insalubre”, disse Mônica ao PORQUE.

O PORQUE tentou ouvir a prefeitura por três dias nesta semana sobre o caixa da Votoprev e a acusação de assédio moral contra a servidora, mas não obteve resposta.

Carta aberta

A transferência de Mônica para trabalhar no cemitério deu origem a uma carta de solidariedade à servidora, que circula em redes sociais desde a noite de segunda-feira, dia 17. A carta é assinada por lideranças de diversos partidos da cidade.

Alguns dos signatários são o atual vice-prefeito Rodrigo Kriguer (PSD); dois ex-prefeitos, Carlos Augusto Pivetta (PT) e Fernando de Oliveira Souza (União Brasil); dois ex-candidatos a prefeito, Rodrigo Chizolini (Psol) e Silea Benedetti (Solidariedade); dois vereadores, Luciano Silva (Podemos) e José Antônio de Oliveira – Gaguinho (PTB); o ex-secretário municipal João Soares de Queiroz (PSB), o presidente da Associação dos Metalúrgicos Aposentados (Amaso) Vanderlei Pedroso, entre outros.

“A sequência dos atos e a forma como ocorreram caracteriza-se como evidente caráter de perseguição contra a servidora!”, afirma um trecho do documento, que também registra: “E por isso unimos nossas vozes em defesa da liberdade de expressão e em repúdio aos atos praticados pela administração [que] denotam a conclusão de evidente perseguição contra a Servidora.”

Na manhã do dia 18, terça-feira, um grupo de servidores acompanhou a sessão da Câmara Municipal para manifestar apoio a Mônica, repudiar a atitude da prefeita e pedir atenção dos vereadores à questão do alegado déficit na Votoprev.

As denúncias de Mônica

Mônica vem afirmando pela imprensa, desde o início de 2022, que o déficit financeiro mensal da Votoprev soma R$ 1,7 milhão, enquanto o déficit atuarial acumula mais de R$ 1,09 bilhão — o que é uma mera “projeção”, segundo disse a prefeita a uma rádio.

Durante seu mandato como presidente da Votoprev, Mônica, que é formada em Direito, diz que informou a situação à chefe do Executivo, por documentos, em 2021 e 2022, “mas ela não tomou providências, tornando-a corresponsável pelo futuro da seguridade e das contas públicas”, afirma a servidora ao PORQUE.

A funcionária pública também esclarece que, na ocasião, esteve na Câmara Municipal, junto com demais diretores da Fundação, “para informar o problema aos vereadores e pedir atenção deles ao tema”.

Mesmo Mônica afirmando que o problema se acumula desde 2005, portanto, durante gestões de cinco prefeitos, Fabíola Alves passou a responder à questão em suas redes sociais como se o alerta fosse uma crítica direta à atual administração.

Por discordar da prefeita, Mônica pediu exoneração da Votoprev em maio deste ano. Recentemente, Fabíola admitiu em entrevista a uma rádio que “queria a saída” da ex-presidente da Fundação.

Transferências da servidora

Após a renúncia, a servidora voltou à secretaria de Saúde, para a qual tinha prestado serviços a maior parte de sua carreira. Mas a administração Fabíola resolveu transferir a denunciante para uma escola no Jardim Tatiana.

Em agosto deste ano, o Ministério do Trabalho reconheceu, em despacho, a procedência das denúncias de Mônica sobre a Votoprev e deu prazo até 24 deste mês para a Prefeitura apresentar um plano de sustentação dos benefícios de aposentados e pensionistas atuais e futuros.

O fato foi tema de uma reportagem publicada no jornal Gazeta de Votorantim dia 8 de outubro. No dia 10, Mônica foi comunicada verbalmente pelo secretário municipal de Serviços Públicos, Luiz Antônio Cares, que seria transferida de cargo novamente, desta vez para o cemitério municipal.

Ela afirmou ao PORQUE que considerou o aviso de transferência uma punição por se manifestar sobre a Votoprev e gravou a conversa com o secretário, mas aguardou a mudança ser oficializada no jornal oficial no município.

No dia 14, a portaria “ex-officio” (nº 20.087) foi publicada no Jornal do Município e “removeu” Mônica Fida da Secretaria de Educação para a Secretaria de Serviços Públicos, mas sem identificar o local de trabalho.

No dia 17, segunda-feira, Mônica recebeu um ofício (337/2022-SESP) informando que ela passaria a trabalhar, a partir daquela data, na administração do Cemitério, no bairro Barra Funda, das 8h às 17h.

Além de ex-funcionária da Saúde e da Educação e ex-presidente da Votoprev, Mônica trabalhou na Justiça Eleitoral (requerida pelo órgão por empréstimo ao município) durante a gestão do ex-prefeito Fernando de Oliveira.

Hoje o cemitério conta com uma escriturária com salário superior a R$ 10 mil devido a uma decisão da prefeita Fabíola, considerada “persecutória” e “antidemocrática” até por partidos políticos costumeiramente de matizes ideológicas divergentes na cidade.

Leia a íntegra da carta aberta em defesa da Monica.

“Nota em solidariedade à servidora Monica Fida

Em nome da democracia e dos princípios que norteiam a administração pública, não podemos nos calar ante o uso da força do aparato público contra uma servidora concursada removida ex officio, caracterizando-se uma forma de punição por divulgar suas ideias e opiniões.

Monica Fida é servidora concursada da Prefeitura Municipal, exercendo a função de escriturária, desde o ano de 2006.

Durante mais de dez anos esteve lotada na Secretaria da Saúde e em 2021 foi escolhida para a Presidência da Fundação da Seguridade Social dos Funcionários Públicos de Votorantim (Votoprev).

Cumprindo sua obrigação, ela e sua diretoria elaboraram um diagnóstico sobre a situação econômica da Fundação, visando garantir as aposentadorias futuras dos servidores e levou o mesmo às esferas cabíveis, principalmente à Sra. Prefeita Municipal.

Terminado seu mandato como Presidente, após pedir desligamento da Votoprev, na condição de servidora, continuou a se manifestar sobre os problemas da Fundação, retornando a sua função de origem na Secretaria da Saúde.

Ocorre que, a Prefeita Municipal, em claro caráter persecutório, removeu a funcionária de sua Secretaria para a da Educação, em escola do Jardim Tatiana, tentando calar a funcionária. Como esta continuou a se manifestar, inclusive pela imprensa, sobre a situação da Votoprev, novamente foi removida pela Prefeita, de ofício, para a Secretaria de Serviços Públicos, onde foi informada que ficará nas dependências do cemitério municipal, e assim, dificilmente terá contato com outros servidores.

A sequência dos atos e a forma como ocorreram caracteriza-se como evidente caráter de perseguição contra a servidora!

Por esse motivo, independentemente do mérito das denúncias, estamos prestando nossa solidariedade a servidora Mônica Fida, que nada mais faz que exercer o seu direito de servidora e de opinião, dentro dos estritos limites da Lei, usando, inclusive os órgãos fiscalizadores, como é o seu direito.

A administração pública deve se pautar pelo princípio da moralidade, legalidade e impessoalidade.

Mas o que numa democracia não se admite é calar a voz das pessoas pelo medo, pela perseguição. Isso é grave!

E por isso unimos nossas vozes em defesa da liberdade de expressão e em repúdio aos atos praticados pela administração denotam a conclusão de evidente perseguição contra a Servidora.

‘Injustiças sob o sol: No trono do direito, a iniquidade; no trono da justiça, a iniquidade’ (Eclesiastes 3:13)”

Assinam:

Carlos Augusto Pivetta;
Edson Locatelli;
Eric Romero;
Fernando de Oliveira Souza;
Heber Martins;
João Soares de Queiroz;
José Antônio de Oliveira – Gaguinho;
Le Baeza;
Luciano Silva;
Luiz Carlos dos Santos;
Marcelo Rosa;
Marcos Mancio;
Mario Nieri;
Milton Feitoza;
Rodrigo Chizolini;
Rodrigo Kriguer;
Silea Benedetti de Macedo Pedroso;
Silene Germano Robes;
Vanclei Franci;
Vanderlei Pedroso de Almeida.

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