
Francisco Moreira de Campos, o Chico do Rio: ainda na luta por direitos, depois de uma vida inteira de dedicação à causa ambiental. Foto: José Finessi
Se Iara, a sereia, é a protetora das águas doces, aqui em Sorocaba o rio que leva o nome do município conta com uma proteção a mais: a do Chico do Rio, como é conhecido o sorocabano que sempre se importou com as causas do Meio Ambiente. Francisco Moreira de Campos, o Chico do Rio, lutou, entre outras coisas, para que na Lei Orgânica do Município constasse que 1% de todo o orçamento da cidade fosse usado para a despoluição e preservação do rio Sorocaba. Para tornar realidade esse feito, fez da sua vida uma constante em defesa do rio. Mas agora é ele, seu Chico, quem luta pela vida e pede socorro.
Com 89 anos, o veterano ambientalista enfrenta o câncer, enquanto sua família se mobiliza para que ele receba um atendimento melhor da Fundação da Seguridade Social dos Servidores Públicos Municipais de Sorocaba (Funserv), com a qual contribui há 30 anos. Sua filha Gilmara de Campos entrou na Justiça com um pedido de liminar para garantir atendimento humanizado ao pai e o serviço de home care, inclusive com o fornecimento dos insumos para o tratamento. A Funserv alega que os pacientes segurados não têm direito ao home care, e afirma que o tratamento fornecido ao segurado tem sido feito “dentro da normalidade”.
Queixas da família
Seu Chico esteve internado desde 6 de agosto no Hospital Evangélico, em Sorocaba, quando familiares decidiram pela hospitalização, já que ele não urinava havia mais de 24 horas. Apesar do seu estado de saúde, que inclui outras comorbidades, como Parkinson e sequelas de um AVC (acidente vascular cerebral), Chico se alimentava normalmente por via oral. Mesmo assim, o hospital optou por colocar uma sonda nasogástrica no paciente, o que incomodou seus familiares. A expectativa era de que a intervenção seria temporária, usada apenas para hidratá-lo, mas o uso da sonda se prolongou mais do que o esperado e Chico do Rio se enfraqueceu ainda mais, tendo dificuldades agora para se alimentar novamente por via oral.
A solução foi usar um outro tipo de sonda, chamada GTT – um dispositivo que insere um pequeno tubo flexível na região abdominal, na altura do estômago, para a alimentação do doente. Para a manutenção desse dispositivo, é necessário conhecimento técnico, e seu manejo deve ser feito por profissionais da saúde.
Como ex-servidor público municipal, Chico do Rio é segurado da Funserv, mas, segundo relatos de sua filha Gilmara, neste momento em que o pai mais precisa de auxílio, a fundação tem descumprido com suas obrigações.
Seu Chico teve alta médica em 3 de outubro e voltou para casa, mas, segundo entende a filha, precisará do serviço do tipo home care, já que assim poderá contar com a presença de auxiliares de enfermagem 24 horas por dia, que inclusive poderão manipular a sonda GTT com segurança. O custo do home care e da sonda é alto e Gilmara entende que ele deve ser custeado pela Funserv. “A Funserv foi paga por mais de 30 anos e agora que meu pai precisa dela, não encontramos esse apoio. Estou indignada com o desprezo, com a falta de ética e consideração por meu pai, que sempre foi um ser humano maravilhoso, um homem que dedicou a vida toda pelo bem da humanidade e do município, inclusive como servidor público”, diz Gilmara.
Mudança de quartos
O problema do atendimento em casa surgiu com a decisão do hospital de dar alta para seu Chico. Mas antes disso, a filha também não estava satisfeita com as instalações em que o pai foi colocado. Quando chegou ao hospital, Chico foi acomodado num quarto da ala de Oncologia, mas, passados alguns dias, em 27 de agosto, foi transferido para um quarto de enfermaria, com menos profissionais de saúde dedicados ao seu atendimento.
De acordo com Gilmara, o quarto da Enfermaria era pequeno, sujo, não havia local para banho de chuveiro dos doentes (apenas banho na cama) e os auxiliares de enfermagem estavam sobrecarregados, o que impactou na atenção dada aos pacientes. Também havia poucas visitas de fonoaudiólogo e fisioterapeuta.
Para a filha, o atendimento ao seu pai foi negligenciado pela Funserv. “Simplesmente o jogaram na calada da noite em um porão, correndo todos os riscos possíveis.” Diante desse fato, Gilmara publicou um desabafo nas redes sociais, tornando público o drama vivido pela família. “Com o relato que fiz no Facebook, algumas pessoas entraram em contato e tentaram ajudar. Em 27/9, com a ajuda das pessoas que viram meu manifesto em uma rede social, conseguimos que ele fosse para um quarto melhor”, contou a filha, em entrevista concedida antes de saber que o pai receberia alta.
O que diz a Funserv
Procurada pela reportagem para se manifestar, a Funserv argumentou que “o tipo de acomodação garantida pela entidade é a diária de internação em quarto individual até o período de 30 dias. Após esse tempo, o paciente é transferido para quarto coletivo de dois leitos, segundo diz a legislação vigente. Essa regra serve para todos os segurados e em todos os hospitais conveniados à Funserv.” A nota enviada ao Porque também aponta: “A informação sobre os hospitais está disponível no site da fundação (https://www.funservsorocaba.sp.gov.br/) para a livre escolha dos segurados.”
Em relação ao atendimento prestado no hospital, a Funserv informou que possui um canal Fale Conosco que, quando acionado pelos familiares do paciente, solicita esclarecimentos e providências dos prestadores credenciados, que são de livre escolha dos beneficiários.
A Funserv confirmou ainda que Chico do Rio está vinculado à fundação desde sua criação, em 1993, mas observou que o sistema é único e trata a todos de maneira igual, independente da contribuição, que é proporcional aos vencimentos, ou da idade.
“Seu Chico não tem direito ao serviço de home care, conforme a norma que rege a Funserv, que afirma desconhecer “qualquer situação ou solicitação específica” em relação à sonda. “Todos os procedimentos e tratamentos solicitados para o mesmo em ambiente hospitalar estão sendo atendidos normalmente, independentemente do tipo de acomodação, que nada interfere na questão técnica”, alegou a fundação.
A nota informa ainda que a gestão da Funserv é feita totalmente por servidores públicos, também beneficiários do mesmo sistema. Hoje, a presidência da fundação é exercida por Silvana Maria Siniscalco Duarte Chinelatto.
O que diz o Hospital Evangélico
Em resposta ao Porque, o Hospital Evangélico argumentou, por meio de nota, que “preza pela qualidade na assistência aos seus pacientes, seguindo todas as normas previstas contratualmente com as operadoras de planos de saúde, bem como aquelas determinadas pela legislação aplicável aos hospitais.
O Hospital Evangélico conta com um quadro de profissionais qualificados que asseguram o atendimento e o bem-estar de seus pacientes.” A nota conclui: “É importante ressaltar que a instituição tem por norma não comentar qualquer aspecto de internação envolvendo os mesmos.

Nos anos 1980, para cima e para baixo com seu Fusca, Chico reuniu milhares de assinaturas para mudar a Lei Orgânica e incluir a despoluição do rio. Para conhecer mais sobre Chico do Rio e sua luta pela despoluição do rio Sorocaba, assista a um minidocumentário produzido em 2018, em que ele conta um pouco de sua trajetória e visão de mundo (link aqui).