
Cuidadores deveriam ajudar os professores na atenção aos alunos cadeirantes, com down, autismo e outras necessidades especiais. Foto: Divulgação/gestaoescolar.org.br
A empresa terceirizada AJG, contratada pelo governo Rodrigo Manga (Republicanos), tem enviado trabalhadores sem nenhum preparo para cuidar de crianças com necessidades especiais nas escolas municipais e creches de Sorocaba. O resultado é que os estudantes são xingados, humilhados e tratados aos gritos, de acordo com denúncias recebidas pelo Portal Porque, de pais de alunos e servidores municipais que trabalham em escolas. Segundo as denúncias, as crianças têm suas necessidades expostas com frequência aos demais alunos pela própria pessoa que deveria cuidar delas.
Uma professora de um CEI (Centro de Educação Infantil) na zona norte, que prefere ter seu nome mantido em sigilo por temer represálias, deu entrevista exclusiva ao Portal Porque. “A empresa manda para as escolas pessoas sem nenhum conhecimento para ser cuidador. Algumas pessoas sequer fizeram entrevistas. Existe um banco de dados e a contratação é realizada através de grupos de whatsapp [de pessoas que buscam emprego]”.
“Conclusão: os professores estão passando por situações super delicadas, porque ao invés de terem um apoio, viramos fiscais para evitar situações absurdas. Já aconteceu de cuidador que ofende a criança, que expõe a criança perante os demais, pessoas desequilibradas que nunca deveriam estar na escola, nem o básico da função eles sabem. E não há nenhuma supervisão pela empresa ou pela Secretaria da Educação nas escolas”, disse a docente.
O Porque teve acesso a reclamações idênticas, por informações de servidores públicos e pais de alunos, em escolas e creches dos bairros Jardim Santo André, Vila Olímpia, Vila Carvalho, São Guilherme, Mineirão, Vila Helena, Jardim Simus e Santa Bárbara. Todas as pessoas ouvidas pela reportagem, porém, pedem para não ter seus nomes revelador por medo de represálias por parte da atual administração municipal.
Culpa não é do trabalhador
A vereadora Iara Bernardi (PT), que também é professora, disse ao Porque que vem recebendo denúncias sobre pessoas sem formação enviadas para as escolas pela terceirizada da Prefeitura. “Recebi denúncias nesse sentido não só de professores, mas de outros servidores que atuam nas escolas e também de pais de alunos”.
Para a vereadora, a culpa muitas vezes nem é dos cuidadores e cuidadoras. “A maioria são jovens, sem formação na área, mas se cadastram em bancos de empregos ou nessa empresa terceirizada (AJG), que diz fazer de tudo quanto é tipo de serviço. Eles precisam de trabalho, mas são contratados sem nenhum treino, nenhuma formação, nenhum conhecimento da função, nenhuma cartilha sobre como tratar crianças especiais”, esclarece a parlamentar.
Segundo Iara, a responsabilidade e a culpa são da Prefeitura. “A gestão Manga é que faz esse tipo de contrato genérico e não faz e nem pede treinamento, nem faz ou exige fiscalização. A Secretaria de Educação deveria saber que esse tipo de serviço deve ser feito por professores, pedagogos ou, no mínimo, auxiliares de educação que passaram por concurso”.
Emocional abalado
Outra professora que leciona em um CEI na zona norte disse à reportagem que ouviu um cuidador comentando que a AJG está “arrasando” em Sorocaba, pois, além de terceirizar funcionários nas escolas, está fazendo o mesmo nos Caps e residências terapêuticas.
“E se o professor orienta [a cuidadora terceirizada] sobre sua função, sobre o que pode ou não dentro da escola, elas ficam bravas, discutem, reclamam que não tratamos com respeito, que o patrão delas é a empresa…”, diz a profissional de educação ao Porque.
Já uma professora de CEI na zona leste desabafou sobre essa situação: “parece um plano da Prefeitura e da Secretaria de Educação para acabar coletivamente com o emocional dos docentes. Além de tudo, o que estamos passando: salas super lotadas, falta de formação, falta de funcionários, falta de material dos alunos (o kit escolar chegou agora e faltando itens)… E agora somos fiscais de cuidadores também”.
Contrato de R$ 30 milhões
O Porque apurou que realmente a AJG fornece pessoal tanto para a Educação quanto para a Saúde, via Prefeitura. O valor desses contratos, juntos, é de aproximadamente R$ 30 milhões.
No começo deste ano, a empresa assumiu a gestão, por contrato emergencial, sem licitação, de quatro creches que eram administradas pelo Centro de Orientação e Educação Social (Coeso). Depois que caiu nas graças do governo Manga, a AJG passou a atuar em boa parte das 140 escolas municipais, além de unidades de saúde.
A reportagem tentou contato o dia todo nesta segunda-feira, 28, com a Prefeitura e com a empresa terceirizada, por telefone e por e-mail. Mas não obtivemos retorno. O espaço fica à disposição se as partes envolvidas quiserem se manifestar.