
O artigo 37 da Constituição Federal elenca a publicidade entre os princípios da administração pública. A Carta também assegura o direito dos brasileiros à informação. Foto: Reprodução
Uma das marcas distintivas dos regimes ditatoriais, em qualquer lugar do mundo ou momento histórico, é a falta de transparência. O ditador — ou grupo dirigente — toma decisões sem consultar a população, conforme planos que ninguém sabe como e por que foram traçados. E a imprensa oficial — assim como toda a imprensa, mantida sob severa vigilância — divulga aquilo que interessa ao governo divulgar.
Não por acaso, os constituintes de 1988, ao escrever a Constituição Cidadã que enterrou oficialmente o estado de exceção no Brasil, fizeram inscrever, no artigo 37 da Carta Magna, a publicidade como um dos princípios a que a administração pública deve estar subordinada, no mesmo nível de outras premissas basilares, como a legalidade, a impessoalidade, a moralidade e a eficiência.
Esse artigo dialoga com outro, o direito de todos à informação, inserido no capítulo Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos (art. 5o, XIV). Informar os assuntos de interesse da sociedade, de forma clara, sem evasivas, não é um favor ou algo facultativo: é obrigação constitucional. Dar publicidade aos temas de interesse coletivo é condição indispensável à administração pública, em todas as esferas de governo.
Antes de seguir adiante, é preciso esclarecer a diferença entre “publicidade” e “propaganda”. Publicidade, no sentido estrito sacramentado pelos constituintes de 1988, é tornar públicos assuntos relativos ao governo. Propaganda é o que fazem os fabricantes de biscoito, as lojas de lingerie e muitos políticos — estes, por vezes, valendo-se de custosas “Secretarias de Comunicação”: — tentar vender uma ideia, um produto, ou, como está na moda dizer, uma narrativa.
Diante da obrigatoriedade de publicizar as informações oficiais, como aceitar o silêncio do prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) sobre a situação financeira da Prefeitura? Como tolerar a prática sistemática do chefe do Executivo municipal de esquivar-se de questionamentos formulados pelos vereadores, deixando o líder do governo no Legislativo, a quem caberia convocar o secretário da Fazenda para dar explicações, na posição que quem não tem nem vez nem voz junto ao governo que representa?
É verdade que a Prefeitura de Sorocaba está sem dinheiro? Haverá recursos para cumprir os compromissos assumidos? Quais programas e projetos serão prejudicados se a situação financeira desfavorável do Município, já apontada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE), perdurar até dezembro? O orçamento será suficiente para executar as emendas impositivas, para assegurar que as metas fiscais sejam cumpridas? A Prefeitura simplesmente não informa.
Graças a uma inexplicável acomodação dos órgãos de Estado que deveriam fiscalizá-lo e cobrar legalidade de seu governo, Manga nada de braçadas em um lago de águas tranquilas, confiante, ao que parece, de que não receberá sequer um puxão de orelha por descumprir a Constituição.
Até quando há de perdurar esse silêncio ensurdecedor na cidade de Sorocaba? Silêncio que envergonha a uns, desqualifica outros, lança sobre quase todos, com raras exceções, a suspeita da conivência e da omissão?
*José Carlos Fineis é editor-chefe do Portal Porque.