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Linc exclui três projetos por falta de verba e apenas dez seguem para fase documental

Proponentes pré-habilitados deverão entregar documentos solicitados até 8 de junho (próxima quinta-feira), no Chalé Francês

Maíra Fernandes (Portal Porque)

Sede atual da Secretaria da Cultura de Sorocaba, o Chalé Francês está localizado na Avenida Dr. Afonso Vergueiro. Foto: Divulgação

Dos 13 projetos que concorriam à aprovação da Linc (Lei de Incentivo à Cultura) 2023, três foram desabilitados e não serão contemplados por falta de verba para a realização. Desse modo, de acordo com publicação da Secult (Secretaria de Cultura de Sorocaba) no Jornal do Município de 29 de maio, apenas dez projetos, entre os 71 concorrentes, foram pré-habilitados pela Comissão Avaliadora e passam agora para a fase documental. Clique aqui para ver a publicação e os documentos solicitados para os pré-habilitados.

Os projetos aprovados – entre as categorias Primeiros Projetos e Projetos Experientes – custarão R$ 486.630 mil da verba de R$ 530 mil disponível neste ano. Para atender aos três projetos desabilitados por falta de recursos – dois da área de artes cênicas e um da área de artes visuais – seria preciso, pelo menos, pouco mais de R$ 180 mil.

Para a proponente Cacau Braga, que chegou até a etapa final do processo e foi desabilitada por não haver recursos, mais uma vez a falta de transparência e o excesso de burocracia prejudicaram o seu projeto. “Eles retiraram vários pontos do meu projeto, usando o mesmo argumento e, ainda, tomando como exemplo um edital de Curitiba, quando temos aqui o edital do ProAC [Programa de Ação Cultural]”, reclama.

Como explica, foram retirados muitos pontos, pois o seu projeto seria divulgado pela internet, considerando que se trata de um produto digital, cujo público-alvo se concentra nas redes. Na justificativa da negativa do recurso, no entanto, a Comissão Avaliadora alegou que a divulgação deveria ocorrer também por outros meios.

Cacau reitera que a mesma comissão que zerou sua pontuação no quesito orçamento aprovou projeto para a gravação de um DVD, “uma mídia que nem se usa mais”. Do mesmo modo, salientou que outro projeto na área de letras, que não costuma ser oneroso, foi aprovado por um total de aproximadamente R$ 80 mil. Ela afirma que não critica a concepção dos projetos que não conhece, mas sim os parâmetros utilizados para a habilitação.

Só para profissionais

Os dez proponentes pré-habilitados deverão entregar os documentos solicitados até 8 de junho (próxima quinta-feira), no Chalé Francês. Entre aqueles normalmente pedidos como RG, CPF, comprovante de quitação eleitoral, domicílio, entre outros, destaque para o mais criticado pelos artistas, que é a obrigação da apresentação de uma carta do Sated (Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões no Estado de São Paulo).

O documento em questão endossa que todos os artistas e técnicos de luz e som que constam na ficha técnica de um determinado espetáculo estão aptos para participar do projeto, ou seja, são profissionais reconhecidos pela Delegacia Regional do Trabalho.

O problema apontado pela classe, principalmente das artes cênicas, é que tal exigência exclui artistas amadores, por exemplo, sem o DRT (registro profissional e regulamentado emitido pela Delegacia Regional do Trabalho), bem como projetos independentes, a maioria na concorrência da certame.

A exigência da licença passou a ser cobrada pela Linc em 2018. Antes, em 2017, o Sated conseguiu suspender, por um curto período, o edital da lei. Após cobranças dos artistas para que o processo não fosse cancelado, a entidade entrou em um acordo com a Secult, retirou a exigência e o certame não foi prejudicado. No entanto, no ano seguinte, ele voltou a ser exigido nas documentações.

“Já acho um absurdo não ter espaço para o teatro amador, como se todos que fazem teatro tivessem obrigação de ter esse maldito DRT. Agora, deixar o Sated, que aliás está em pé de guerra, decidir quem pode ou não participar de trabalhos é realmente debochar da nossa cara. Os inúteis [se referindo ao secretário da Cultura, Luiz Antonio Zamuner, e ao prefeito Rodrigo Manga], não podem, de forma nenhuma, determinar que o Sated, que nada faz pelos artistas, seja o órgão de censura que vai fazer o trabalho sujo para eles. Porque parece que é disso que se trata”, reclama a diretora teatral Edeméia Pereira.

Marcelo Nascimento, diretor e produtor teatral, também critica a exigência. “Eu sou sindicalizado, tenho dois DRTs, mas acho que em um edital como a Linc não é pertinente essa cobrança. É um edital com verba pequena, ninguém ganha um grande valor e a maior parte em artes cênicas são amadores. Um ProAC, por exemplo, não pede”, exemplifica, acrescentando que a exigência do sindicato da classe nunca foi uma posição da Secult, mas sim uma imposição do Sated.

“Exigência ridícula”

No entendimento de Benedito Augusto de Oliveira, o Benão, diretor de teatro, esse assunto merece um potente debate da classe artística sorocabana. Para ele, tanto artistas profissionais quanto amadores podem coexistir e apresentar seus trabalhos.

No entanto, caberia ou uma brecha no próprio edital ou outro certame local que não obrigasse artistas amadores a se profissionalizarem por conta de um ou dois espetáculos que farão. “Acho a exigência ridícula. Isso retraiu a classe teatral em Sorocaba, tudo por conta desses malditos editais que exigem DRT. O fato de eu entrar com um projeto na Linc não quer dizer que eu viva disso. Eu acho que esses editais tiraram a criatividade do teatro amador, experimental e independente”, critica.

Ainda para Benão, é importante que o Sated considere que uma cidade como Sorocaba não oferece esse espaço para exercício profissional como atividade fim tanto para artistas quanto iluminadores e técnicos de som. “Técnicos de iluminação teatral, por exemplo, devemos ter dois ou três em Sorocaba”, salienta.

Mesmo os artistas com DRT, como ele, não podem ser considerados profissionais, pois não vivem da arte como atividade fim. “Eu não vivo do teatro, a Edeméia Pereira, uma das melhores diretoras de teatro que eu conheço, por exemplo, é professora aposentada e está fazendo uma peça de teatro amador. Entender que por ser uma verba pública tem de ser profissional é uma falácia, não quer dizer que eu viva disso.”

Benão defende que ambas as categorias – amadores e profissionais – convivam sem conflitos de interesses de terceiros, concorrendo e produzindo sem exigências que impactam no processo de criação e fomento das artes cênicas na cidade. “É uma questão polêmica que a classe artística precisa debater para chegar a um bom senso.”

Sindicato: não se aplica

O presidente do Sated/SP, Dorberto Carvalho, explica que, por se tratar de um sindicato de artistas e técnicos profissionais, não pode dar anuência ao trabalho de amadores. Por isso, quando recebem solicitação da carta da Linc para esses artistas, a resposta que dão é que “não se aplica”, considerando que, enquanto entidade, não podem responder por eles. “A ideia é garantir a segurança dos profissionais e do público. As pessoas querem anuência, pois não têm registro, mas, ainda que seja teatro amador, o Sated não pode emitir”, explica.

Como solução, Dorberto explica que o que pode fazer é receber desses artistas uma autodeclaração deles de amadores e devolver endossando que a categoria não se aplica à responsabilidade do sindicato.

“O Sated sempre brigou em defesa da Linc e para a ampliação dos recursos que achamos muito pouco. Eu já falei isso para o secretário, acho super burocrático o que eles fazem na Linc, mas não estamos aqui para colocar corda no bloco. Quem quiser se autodeclarar amador pode mandar que eu assino embaixo que não se aplica”, conclui.

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