
Debate “Café com Elas”, realizado na terça, possibilitou troca de experiências entre mulheres que atuam na indústria metalúrgica. Foto: Lucas Delgado
A falta de formação profissional, filhos e o machismo estrutural foram apontados como os principais obstáculos enfrentados pelas mulheres na luta por uma colocação no mercado nas empresas metalúrgicas, durante o debate “Café com Elas: A mulher na indústria do presente e do futuro”, promovido nesta terça-feira, 22, pelo Sindicato dos Metalúrgicos de Sorocaba e Região (SMetal), com apoio do Coletivo de Mulheres da entidade sindical.
No evento, representantes de fábricas na região de Sorocaba expuseram os principais problemas enfrentados pelas mulheres para ingressar em vagas de trabalho e propuseram modificações para modificar este quadro.
De acordo com gráfico apresentado no evento, o crescimento do gênero feminino em funções dentro das fábricas subiu 0,48% em dois anos. Dos 42.590 mil trabalhadores empregados nas catorze cidades que compõem a base das empresas metalúrgicas da região de Sorocaba, apenas 8.215 são mulheres, ou seja, 19,29% de trabalhadoras. Em 2021 a porcentagem era de 18,81%. Os dados são do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), com informações do Ministério do Trabalho.
Para trazer modificação para este quadro, as empresas têm buscado proporcionar oportunidades de formação profissional e específica para este público. Formá-las para profissões antes vistas como de homens.
Emília Martins, coordenadora de RH da Flextronics, explica como os projetos para promover esta ascensão feminina são oferecidos para as trabalhadoras em sua empresa. “Temos um papel fundamental na sociedade, e não é diferente na Flex. As mulheres têm representatividade em todos os níveis. Existe uma política desde 2017 com comitês, inclusive para a demanda de mulheres em TI [Tecnologia de Informação]”, disse ela, referindo-se a projeto criado na empresa para formar mulheres programadoras.
“É preciso dar condições para ela entrar e continuar… E que as ações da empresa estejam de acordo com o discurso”, afirmou Renata de Melo Silva, Gerente de RH da Apex Tools.
Muito a conquistar
Funções profissionais que antes eram estritamente exercidas por homens, com o avanço das conquistas, têm imposto às indústrias e demais categorias a promoção de novos caminhos para ampliar e garantir oportunidades igualitárias e contribuir para que mulheres cheguem a funções de lideranças.
Entretanto, esta desigualdade fica ainda mais evidente quando comparados os cargos ocupados por elas nas empresas. Das 707 ocupações profissionais existentes no ramo metalúrgico, apenas 356 têm mulheres. O número indica que mesmo em progressão nas questões de igualdade entre gênero, as mulheres ainda não estão inseridas por completo no mercado de trabalho. Este é um recorte do ramo metalúrgico, mas que pode ser utilizado como comparativo para demais categorias profissionais quando se trata de cargos de lideranças, ocupados por homens na grande maioria.
“Metade do mundo é feita de mulheres, a outra metade são filhos delas”, observou Emília Martins ao comentar a participação da mulher, que é maioria no Brasil e no mundo, no mercado de trabalho. De acordo com ela, as empresas têm tido um olhar diferenciado neste quesito. “Na Flextronics a mulher sempre fez parte do quadro de funcionários por conta da natureza do trabalho extremamente minucioso”, informou.
Se, por um lado, na Flextronics existe uma grande parte de funcionárias do gênero feminino, na Toyota a realidade é diferente. Em busca de proporcionar integração e aumentar o número de mulheres nas atividades da fábrica, a Toyota desenvolveu um projeto, antes da pandemia (2019), com o objetivo de contratar mulheres para a produção. Conforme expôs Juliana Fochi, gerente de RH da Toyota, o desafio que surgiu após a ocupação destes cargos foi o de proporcionar a integração e o senso de dignidade delas no ambiente.
“A Toyota tem trazido um caminho de integração. Às vezes é muito mais fácil trazer a mulher para uma posição interna que ela já venha formada de outra indústria. Nós nos propusemos a fazer a jornada do desenvolvimento e contratar mulheres para a produção e a aprender com elas. Encontramos uma série de desafios, nossos uniformes não eram uniformes em que elas se sentissem mulheres. Não havíamos reparado antes da experiência que não tínhamos nem banheiros suficientes para mulheres”, relata a gerente.
Educação sobre os direitos
Além da educação profissional, outro caminho levantado no debate para garantir que a mulher alcance novas oportunidades é o de educar sobre os direitos da mulher dentro da empresa e na sociedade, uma vez que esta mulher possa sofrer assédio moral e sexual.
Durante o debate, foi questionado o destino das denúncias. “Se a denúncia vai para um homem que se identifica com um agressor, quando ele ouve o depoimento, pode omitir o relato e a mulher ser prejudicada”, advertiu Leandro Soares, presidente do SMetal.
Para o combate a essas práticas criminosas, deve-se fazer valer as leis dentro e fora das empresas e a tolerância zero, com demissão por justa causa, deve ser aplicada. Natália Rela, gerente de Talent da Emerson, opinou que a rapidez da resposta para assédios é importante e que é preciso a participação de mulheres na escuta delas para que haja empatia. “Existem leis que respaldam a trabalhadora neste sentido e devem ser cumpridas e os compliances (conformidade de normas e leis) de denúncias devem contar com mulheres”, completou Natália.
Por colocar todos esses temas em pauta e permitir um aprofundamento dos debates, a coordenadora do coletivo de mulheres do SMetal, Priscila dos Passos, considerou o encontro “um momento muito especial”.
Já Leandro Soares ressaltou que a atividade é fomentadora de ações para os anos seguintes “Mesmo sendo um pequeno crescimento, nós avançamos bastante. Entendemos que é muito pouco, mas é um passo para que desse debate saiam planejamentos e daqui a cinco, dez, vinte anos, nós possamos, no mínimo, ter a equidade dentro da nossa base”, concluiu.