Em julho do ano passado, um outdoor afixado próximo ao Ministério Público, na avenida Engenheiro Carlos Reinaldo Mendes, cobrava celeridade nos processos encaminhados às Varas da Família da Comarca de Sorocaba. “Nós gostaríamos que a 2ª Vara de Família de Sorocaba e a promotoria trabalhassem!!”, pedia o anúncio, contratado por um pai que estava há 20 meses sem poder ver o filho, por conta da morosidade nos trâmites judiciais. Passado um ano, a situação não mudou e advogados denunciaram ao PORQUE as dificuldades que têm enfrentado para dar prosseguimento aos trabalhos que tramitam nessas unidades judiciais. “Está em colapso”, afirmam.
Os advogados e advogadas ouvidos terão a identidade preservada para evitar exposição, no entanto, garantem que essa situação – que impacta tanto a vida dos profissionais quanto dos clientes – já vem se arrastando há bastante tempo, sem solução. “Causa injustiça e tristeza ter que esperar anos por uma decisão judicial. A impressão que temos hoje é que, além de termos um Judiciário moroso, ele não se importa com a situação, pois todos os protocolos de controle existentes são incipientes, a conta sempre fica para o jurisdicionado, sendo essa prestação de serviço forense cara e custosa para os clientes”, reclama uma das advogadas. Ela lembra, ainda, que a lei sobre celeridade processual é bem clara: a emenda constitucional 45/04, que tratou da reforma do Poder Judiciário, foi a responsável por incluir, na Constituição Federal de 1988, o direito fundamental ao processo em tempo razoável. Antes disso, explica ela, este direito vinha disposto de forma indireta no ordenamento jurídico.
DENÚNCIAS
De acordo com os profissionais ouvidos, a situação se complica mais por se tratar de direito de família, um dos mais dinâmicos, e que modifica de uma hora para a outra. “Tudo é urgente”, conta uma das entrevistadas, lembrando que o impacto na vida das famílias é enorme. Ela cita como exemplo casos de processos sobre regime de visitação, cuja demora pode implicar em prejuízo emocional para o filho ou filha, principalmente se for criança ainda nas fases iniciais da vida. Outra advogada comenta que existe processo de divórcio aguardando despacho inicial há cinco meses, além de outras resoluções simples, que não demandam tanto tempo para serem solucionadas.
Um dos advogados diz que só havia presenciado situação similar em 2004, quando ocorreu a maior greve do Judiciário paulista, com paralisação de quase cem dias. Para ele, a Vara da Família passou de colapsada para “paralisada”.
As reclamações não apontam apenas a morosidade como problema – especialmente da 2.a Vara de Família –, mas também para erros e tratamento grosseiro aos advogados. “Trabalho exclusivamente com essa área e tem sido triste observar o impacto na vida dos clientes”, lamenta.
Para uma das entrevistadas, há que se considerar o período de pandemia, que refletiu no atendimento, principalmente para exercer alguns direitos como as visitas, substituídas por videoconferência. No entanto, para ela, a culpa dessa morosidade é de um sistema “obsoleto”, agravada pela junção das Varas de Família em um cartório único. “É o desmantelamento de políticas públicas do Estado. Falta material humano, há sobrecarga de processos, falta pessoal e comprometimento do Judiciário. Não estamos questionando a qualidade das decisões, mas a dificuldade em se ter a tutela do Estado.”
MEDIDAS
A subseção da Ordem dos Advogados do Brasil de Sorocaba (OAB/Sorocaba) afirmou ao PORQUE estar ciente das denúncias e da situação. “A OAB Sorocaba trabalha tal questão e, tão logo obtenha a solução, deverá comunicar a advocacia”, informarou.
De acordo com os advogados ouvidos pelo PORQUE, a OAB criou um formulário para ouvir os profissionais sobre essas reclamações; no entanto, não especificou quais medidas serão tomadas e quando.
No ano passado, quando da denúncia via outdoor, a entidade informou que havia oficiado à 2.a Vara da Família e Sucessões da Comarca de Sorocaba, pedindo providências relacionadas ao impulsionamento dos processos daquela unidade judicial. À época, a OAB justificou que o ofício era motivado por diversas reclamações recebidas pela subseção.
O PORQUE também questionou o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ/SP), a fim de uma explicação sobre o motivo da morosidade denunciada; bem como as varas citadas na matéria, mas até a publicação desta matéria não havia obtido resposta.
COMO ATUAM AS VARAS DA FAMÍLIA
De acordo com o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), as varas da Família e Sucessões são responsáveis por processar e julgar litígios relacionados a temas como inventários, testamentos, separação judicial, divórcio, anulação de casamento, investigação de paternidade, ação de alimentos, entre outros.
Também existe a possibilidade de se recorrer à conciliação e mediação para solução dos conflitos, sem a necessidade de um longo processo. Nesse caso, por meio do diálogo, as partes encontram uma solução para a demanda juntas, com o auxílio de um mediador ou conciliador