
Crespo e Manga em agosto de 2018, quando o atual prefeito, então presidente da Câmara, assumiu como interino devido a uma viagem oficial de Crespo. Foto: Secom/Sorocaba
O ex-prefeito José Antônio Caldini Crespo protocolou na Promotoria de Justiça de Sorocaba, dia 23 de janeiro, um requerimento para que a Vara da Fazenda abra um inquérito civil que investigue eventual crime de responsabilidade do prefeito Rodrigo Manga na compra do prédio da Secretaria de Educação (Sedu), por quase R$ 30 milhões.
A suspeita de superfaturamento de R$ 10,3 milhões já tramita na 2ª Vara Criminal de Sorocaba e é alvo de outros pedidos de investigação ao Ministério Público (MP). Para Crespo, o valor total da compra, e não só os R$ 10 milhões, foi desperdício de dinheiro público.
No ofício do ex-prefeito ao MP, ao qual o Portal Porque teve acesso, Crespo argumenta que o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) comprovou que o prédio só foi comprado porque a Prefeitura precisava atingir o piso de 25% do orçamento municipal investidos em educação previstos pela Lei Calmon. Trata-se da Lei 7.348/85, que dispõe “sobre a execução do § 4º do art. 176 da Constituição Federal” e determina aos Estados, Distrito Federal e Municípios a aplicação de “25%, no mínimo, da receita resultante de impostos, na manutenção e no desenvolvimento do ensino”.
Segundo o ex-prefeito, isso demonstra que “a aquisição daquele prédio nem mesmo era necessária, pois a PMS [Prefeitura Municipal de Sorocaba] já possui dezenas de outros imóveis que poderiam numa reforma ou ampliação, se tanto, abrigar com vantagens os interesses funcionais da Secretaria de Educação”.
O Portal Porque procurou a Secretaria de Comunicação (Secom) do prefeito Manga para que a administração se manifestasse sobre a acusação do ex-prefeito, mas não obteve retorno.
No documento à Promotoria, Crespo lembra que as investigações já concluíram estarem corretas as reportagens jornalísticas sobre o fato de o mesmo prédio comprado pelo atual governo ter sido anunciado no mercado imobiliário por R$ 20 milhões, pouco antes da aquisição do mesmo pela Prefeitura. O Portal Porque publicou a notícia na época com exclusividade (leia aqui).
Leis mencionadas por Crespo
No ofício à Promotoria, Crespo também pede que seja apurado se o prefeito Rodrigo Maganhato, “mais conhecido pela alcunha de ‘Manga’”, se enquadra no decreto-lei nº 201/1967, artigo 1º e incisos I, II, III, V e XI.
O artigo e incisos mencionados decretam: “São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipais, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: (…) I – apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio; Il – utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos; Ill – desviar, ou aplicar indevidamente, rendas ou verbas públicas; V – ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei, ou realizá-Ias em desacordo com as normas financeiras pertinentes; XI – Adquirir bens, ou realizar serviços e obras, sem concorrência ou coleta de preços, nos casos exigidos em lei”.
Em seu requerimento, Crespo também pede que seja investigado se Manga pode ser enquadrado na Lei de Ação Civil Pública (7347/85), artigo 1º e incisos IV, V e VIII. O artigo indicado pelo ex-prefeito, que é advogado, diz que “regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:”. E os incisos apontados preveem as seguintes causas: “IV – a qualquer outro interesse difuso ou coletivo; V – por infração da ordem econômica e VIII – ao patrimônio público e social”.
Lei de improbidade administrativa
Outra lei indicada pelo ex-prefeito ao MP é a número 8.429/1992, conhecida como LIA, Lei de Improbidade Administrativa, que, em seu Artigo 1°, determina: “O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei”.
Conforme o resultado do Inquérito Civil (IC), Crespo requer que a Vara da Fazenda do MP analise outros artigos e incisos da LIA, como o artigo 9, que relaciona atos de improbidade administrativa, inciso II “perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no art. 1° por preço superior ao valor de mercado”.
Ele relaciona ainda o artigo 10 da LIA, segundo o qual “constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente:(…) inciso V – permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado”.
Crespo recomenda ainda, no ofício, atenção ao artigo 11, inciso 5, que prevê: “Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: (…) V – frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros”.
Por fim, o ex-prefeito lembra ao MP que o Artigo 12 da LIA “discorre com clareza sobre as sanções cíveis, penais e o ressarcimento, cabíveis”.
Outras representações ao MP
Além de Crespo, também no dia 23 de janeiro, o advogado Ailton Viana Silva protocolou ofício pedindo que o Ministério Público dê parecer positivo para uma ação popular que anule a compra do novo prédio para a Sedu pela Prefeitura.
A ação de Ailton baseia-se na investigação já iniciada pelo MP que afirma ter sido fraudado o processo de desapropriação do prédio. O laudo anexado ao processo de desapropriação foi de um engenheiro que confessou em depoimento ter recebido R$ 20 mil de um ex-secretário, na própria secretaria.
No dia 30 de janeiro, os dois vereadores do PT de Sorocaba, Iara Bernardi e Francisco França, entraram com um pedido no Gaeco, ligado ao Ministério Público/SP, para que investigue seis pessoas por constituição de organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção ativa e passiva na compra do prédio para a Sedu. Leia matéria do Portal Porque aqui.
Colaborou Fernanda Ikedo