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Eleição para Conselho da Mulher termina em confusão e com guerra de narrativas

Mesmo após retirada da comissão eleitoral, que suspendeu a eleição, representantes da direita levaram a votação adiante

Fernanda Ikedo (Portal Porque)

Assembleia, realizada em clima tenso, terminou com versões diferentes: um grupo diz que votação foi suspensa; outro não só discorda como levou adiante a votação. Foto: reprodução/Fernanda Ikedo

Transformada em disputa de território entre mulheres de direita, apoiadas pelo prefeito Rodrigo Manga (Republicanos), e mulheres progressistas, a eleição para a gestão 2023/2025 do Conselho Municipal de Direitos da Mulher (CMDM) terminou em confusão e suspensa pela comissão eleitoral — o que não impediu que a eleição ocorresse.

A assembleia na sede da Secretaria de Cidadania (Secid), na rua Santa Cruz, na noite desta segunda-feira (12), foi tumultuada e definida como um “caos” por participantes. Devido à superlotação do local, a Polícia Militar tentou intervir. A eleição foi suspensa pela comissão eleitoral. No entanto, as representantes da direita continuaram a votação mesmo após a comissão eleitoral se retirar.

Com um público de mais de 600 mulheres na sede da Secid e sem chegar a um acordo se a votação ocorreria por chapa ou nominal (com voto em cada representante de setor), a comissão eleitoral se retirou do local sob vaias das mulheres de direita.

Estavam inscritas candidatas que formaram duas chapas: Mulheres em Movimento pela Democracia, composta por progressistas que pretendem dar continuidade ao trabalho da atual gestão do conselho, e Mulheres em Foco, formada por representantes da direita sorocabana.

Conforme o PORQUE apurou, a articulação da chapa de direita partiu diretamente do Governo Manga, e incluiu pressões sobre funcionários comissionados e terceirizados da Prefeitura (leia aqui).

Com o auditório e corredores lotados, sem ventilação adequada, todas, incluindo idosas, cadeirantes e mulheres com crianças, sofreram com o abafamento e a confusão generalizada por falta de consenso de como seria a votação.

O início da votação ocorreu por volta das 20h30, uma hora e meia após o previsto. A inscrição para poder votar foi estendida das 18h30 para 19h. As filas eram gigantes e ninguém sabia muito bem onde era para se inscrever e onde era para aguardar para a votação.

Como o edital prevê que a eleição seja nome por nome das representantes, as integrantes da chapa Mulheres em Movimento pela Democracia decidiram retirar a candidatura e tentar impugnar a eleição.

No palco do auditório, a comissão eleitoral tentava falar ao microfone e passar instruções, mas a gritaria do público era maior. A impaciência foi trocada por insultos de mulheres que afirmavam estar “lutando para tirar o conselho das mãos da esquerda”, segundo uma das mulheres presentes.

“Tá cheio assim porque as mulheres de direita acordaram. Estamos votando pelos filhos, pela família”, disse a dona de casa Isabel Leal, 49 anos, que foi votar com duas amigas, vizinhas e que compartilharam a colinha no grupo de mães da escola.

Logo após a chapa das Mulheres pela Democracia se retirar, um policial militar pegou o microfone para informar que estava encerrada a votação. Inconformadas, mulheres da direita, que estavam em maioria, gritaram que não ia acabar. “Viemos pra votar, vamos votar.”

A vereadora Iara Bernardi (PT) estava presente e foi insultada pela ala da direita que não respeitou nem a PM.

“A eleição do Conselho foi cooptada desde o início pelo poder público, que montou uma chapa. Mas o poder público já tem direito a 10 representantes. Qualquer mulher pode ser candidata. O problema é quando se usa a máquina pública e exige que funcionários e colaboradores votem numa chapa”, denunciou Emanuela Barros, atual presidente do Conselho.

Ela conta ainda que houve várias irregularidades como “ônibus para votar, que não sei quem fretou, pessoas sendo barradas no portão e outras liberadas”. “Mas o que nos preocupa enquanto presidenta do Conselho é o bem-estar das mulheres. Nós estamos numa onda de covid. A maioria das mulheres estava sem máscara, num local que não comporta a quantidade de mulheres que aqui estavam”, afirmou.

Chegou um ponto que a comissão eleitoral, formada por uma representante do poder público e outra da sociedade civil, decidiu suspender a eleição.

Homens ligados à direita foram vistos no meio das mulheres. Entre eles, o secretário municipal de Segurança Urbana, Alexandre Caixeiro, e o advogado do vereador Dylan Dantas.

Quando a eleição parecia inviabilizada, o assessor de Dantas e uma funcionária comissionada da Secid, militante de Manga nas redes sociais, deram início ao processo de votação, apenas com a chapa Mulheres em Foco na disputa.

Segundo a integrante da comissão eleitoral, Elaine Ruas, o processo eleitoral terminou quando a votação foi adiada pela comissão eleitoral. Não foi possível descobrir com base em que argumento os representantes da direita presentes na Secid acharam ter legitimidade para substituir a comissão eleitoral e dar sequência à votação.

A judicialização do caso é praticamente certa, principalmente se a chapa Mulheres em Foco for eleita nas condições em que a votação foi realizada.

*Este texto foi atualizado para corrigir a informação, presente em alguns trechos, que a eleição havia sido cancelada. Na verdade, ela foi suspensa pela comissão eleitoral.

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